O Brasil acrescentou alguns poucos grandes textos à literatura mundial: além dos contos de Machado, também A hora da estrela e, especialmente, Água viva, de Clarice Lispector, e, na não-ficção, Pedagogia do oprimido, de Paulo Freire, Casa grande & senzala, de Gilberto Freyre, Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus, Os sertões, de Euclides da Cunha, Cemitério dos vivos, de Lima Barreto. Todos esses são, em alguma medida, indispensáveis para mim. Cada um, a sua maneira, com seus limites e suas grandezas, é uma obra-prima.
Mas se eu, hoje, tivesse que escolher um, seria Grande Sertão: Veredas.
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Guimarães Rosa dedicou dez anos à escrita de Grande Sertão: Veredas. Quase no final, sofreu um pequeno infarto mas se recuperou e ainda viveu uma década. Nunca mais, entretanto, empreendeu outra obra de vulto. Tinha medo de não conseguir terminá-la. Passou seus últimos dez anos escrevendo os textos curtos, às vezes curtíssimos, de Primeiras estórias, Tutaméia, Estas estórias e Ave, palavra.
Esses livros têm a sua importância, naturalmente. Rosa era um grande autor. Mas não consigo deixar de considerá-los um desperdício: eles têm a mesma linguagem única e apaixonante de Grande Sertão: Veredas e nada de sua grandeza épica. Em Grande Sertão: Veredas, Rosa se dispôs a caçar um mamute. Depois, se satisfez caçando codornas com estilingue. Codornas deliciosas, mas codornas.
Quando foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, adiou seu discurso de aceitação por anos, porque tinha um medo irracional de que morreria logo depois. Finalmente, não dava mais pra adiar: fez o discurso. Morreu três dias depois.
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Acabei de reler Grande Sertão: Veredas. Minha impressão hoje, agora, no calor do momento, 100% pessoal e no improviso, de supetão e sem revisão, é que é o melhor romance de todos os tempos, ponto. Tenho receio de afirmar isso, mesmo que só pra mim, por medo de ser puro bairrismo.
Ele já está há décadas no meu seleto top5 de romances perfeitos.
- Moby Dick (EUA, 1851), de Herman Melville
- Os Miseráveis (França, 1862), de Victor Hugo
- Guerra e Paz (Rússia, 1867), de Liev Tolstoi
- Grande Sertão: Veredas (Brasil, 1956), de João Guimarães Rosa
- Cem Anos de Solidão (Colômbia, 1967), de Gabriel Garcia Márquez
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Mas será que Grande Sertão: Veredas é o melhor?
Em meu texto sobre os meus dez romances preferidos, eu explico que, pra mim, todo grande romance é cósmico: ele parte da especificidade das situações cotidianas e, a partir delas, abraça a totalidade da existência.
Vamos a isso.
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A monumentalidade da floresta
Apesar de considerar esses romances perfeitos, eles todos (claro!) têm seus erros, tropeços, falhas.
Tolstoi, por exemplo, completamente desinfla o final de Guerra e Paz — o fato de colocar a sua grande digressão no fim e não no meio, como Hugo, faz com que um romance quase perfeito acabe num decepcionante anticlímax. (Fiquei o tempo todo pensando: “Péra, já acabou? Sério? Ele não vai mesmo retomar? Agora é só isso até o fim? Velho filha da puta!”)
Moby Dick tem certamente o melhor final de qualquer romance, uma progressão sensacional de um crescendo sem igual, implacável e inexorável… mas, antes disso, vamos combinar, tem muitos, muitos trechos sofridos.
(Minha esposa acha que cada vírgula em Moby Dick é perfeita, então o parágrafo acima vai causar problemas conjugais aqui em casa, só pra vocês saberem.)
Hugo, a gente sabe, se perde mil vezes em Os Miseráveis: o romance é como uma catedral gótica, imponente pelo inacreditável, inconcebível, maravilhoso empilhamento de belezas, mas cheio de probleminhas pontuais. Notre-dame de Paris provavelmente é um romance mais perfeito, talvez até melhor, que Os Miseráveis, somente menos amplo.
(Um textinho meu sobre Os Miseráveis, escrito para o curso Introdução à Grande Conversa.)
De todos esses, Cem Anos de Solidão foi o que li por último há mais tempo (1996, contra Moby Dick, em 2004; Guerra e Paz, 2017; Os Miseráveis, 2020) e preciso reler com olhos de adulto pra poder falar mais dele. Na época, a única coisa que realmente me incomodou foi uma certa condescendência típica de intelectual urbano ateu de esquerda escrevendo, de cima pra baixo, sobre as crenças das pessoas que, para ele, são “primitivas”, que acreditam nessas crendices que ele (claro!) não acredita mais.
(Rosa e Lispector, ao instituir os “observadores dotôres”, seja o interlocutor invisível em Grande Sertão: Veredas, seja Rodrigo S.M. em A Hora da Estrela, conseguem colocar esse olhar condescendente do intelectual dentro da história — ao invés de flutuando superior — e, ao fazer isso, o problematizam, o questionam, e resolvem, pelo menos pra mim, o que tanto em incomodou em Garcia Marquez.)
Voltando à monumentalidade.
Grande Sertão: Veredas, apesar de ser também tão monumental quanto os outros do top5, se perde muito menos. Mire e veja: nenhum problema se perder ou ter momentos tediosos. Se (como disse o Tarrask, em nosso grupo de zap) ler um livro monumental desses é como domar um potro xucro (às vezes, ele escapa), imagina escrever!
Então, Grande Sertão: Veredas não tem as longas digressões que quebram o meio de Os Miseráveis e emporcalham o fim de Guerra e Paz, assim como não tem as partes longas e tediosas de Moby Dick. E o final é quase tão perfeito, tão bem preparado, tão apocalíptico, quanto o desse último.
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A pessoalidade das folhas
Onde, então, Grande Sertão: Veredas perde?
Para Moby Dick, perde no quesito “melhor final”, como dito.
Na verdade, só tem um critério, pra mim fundamental mas difícil de definir, no qual Grande Sertão: Veredas perde de todos no top5: amplidão. Amplidão de pessoas, sabe? Fofoca de gente humana.
Grande Sertão: Veredas é um mundo, mas é um mundo habitado pela língua portuguesa tal como reinventada por Riobaldo e um mundo habitado pela natureza sem fim das Gerais, mas é um mundo com muito poucas pessoas de verdade.
Mire e veja: o livro tem poucos personagens de fato. Fechamos o romance e, claro, conhecemos bem Riobaldo e… mais quem? Diadorim nós conhecemos tanto quanto Capitu: muito pouco, e através de lentes extremamente distorcidas. Quem mais seria personagem no livro? Talvez só Zé Bebelo.
(O momento em que os personagens aparecem mais individuados é no julgamento de Zé Bebelo que, não por acaso, é o ponto alto de Grande Sertão: Veredas, a nossa Orestéia.)
Eu meio que não ligo pra natureza (mal aí, plantinhas) e, se gosto de línguas, é porque língua é produto de gente, de infinitas pessoas, ao longo de milênios e milênios, usando livremente esses maravilhosos brinquedos para nascer e viver, amar e morrer.
Porque o que eu gosto mesmo é de gente. Literatura é isso: um jeito meio trabalhoso, às vezes pernóstico, que os maiores fofoqueiros da humanidade inventaram pra fazer da fofoca algo respeitável e respeitado.
Grande Sertão: Veredas é cheio de personagens menores fascinantes, mas não sinto que ficaram em mim, não sinto que Rosa fez eu me importar com eles. (Talvez só Maria Mutema.) Tem guerreiros que apareceram por cinco linhas na Ilíada, e só pra morrer!, e me parecem são mais vivos.
(“Então Diomedes, excelente em auxílio, abateu Axilo,
filho de Teutrante, que habitava a bem construída Arisbe,
homem rico em sustento, estimado por todos os homens;
15 a todos dera hospitalidade, pois vivia perto da estrada.
Mas naquele momento nenhum desses afastou a triste desgraça,
em combate contra os inimigos; mas a ambos privou da vida,
ao próprio Axilo e a Calésio, seu escudeiro, que naquele dia
era auriga de seu carro; e ambos passaram para debaixo da terra.”
VI, 12-19, trad. Frederico Lourenço.)
Nada contra um livro não ter muitos personagens, ou ser um estudo sobre só um personagem.
O que estou dizendo é que eu, um dos meus critérios pessoais para um romance ser um dos meus preferidos, é essa amplidão humana, esse gigantesco painel de pessoas de todo tipo.
Tem um velho doido que acompanhou Pierre em seu cativeiro francês que eu nunca lembro o nome, mas está sempre comigo. Não tem um dia em que eu não compare alguma pessoa com quem estou falando a Jean Valjean ou a Javert, aos Thenardier ou aos revolucionários mortos por uma causa perdida. Quando vou fazer algo temerário, posso sentir toda a tripulação do Pequod me cercando mentalmente e dizendo: “calma, nego, vai dar ruim.”
(Não consegui não pesquisar o nome do meu personagem preferido de Guerra e Paz. É um camponês chamado Platão (como o filósofo) Karataiev, que aparece no Tomo 4, primeira parte, capítulo XII. Ele é, ao mesmo tempo, um camponês altamente estilizado, a ideia que um nobre como Tolstoi faria de um camponês perfeito, mas também, por um desses paradoxos que só Tolstoi era capaz, tão impossivelmente humano. Fazendo a busca pelo nome dele, descobri que tem um quarteto húngaro que se autobatizou em sua homenagem e, olha, gostei da música deles. Vejam vocês onde Grande Sertão: Veredas me levou nessa manhã de 23 de setembro no Rio de Janeiro: agora estou ouvindo Platon Karataev)
Hoje, hoje mesmo, 23 de setembro de 2021, escrevi e apaguei uns 5 tuítes criticando alguém, porque pensei “quero fazer desse bosta minha baleia branca?” (Esse último exemplo eu nem citaria, porque não precisa ter lido o livro para ter essa referência, mas é que foi hoje.)
Me ficou a impressão que Grande Sertão: Veredas tenta abarcar as grandes questões humanas (violência, amor, destino) ao custo de não ver, ou não ver de verdade, ou não ver a fundo, as pequeninas pessoas — por querer abarcar a amplidão da floresta, não viu a multiplicidade das folhinhas.
Mas Tolstoi, Hugo e Melville nos ensinam justamente (e, por isso, são grandes mestres) que dá pra fazer as duas coisas.
Aliás, não só dá pra fazer, mas dá pra fazer de baixo pra cima: você considera, você enxerga tantas mas tantas folhas que, no fim, constroi sua própria floresta.
Ou seja, como diria Riobaldo, a literatura é um fazer.
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No meio do caminho, tinha um aviso
Atenção: não estou dizendo que Grande Sertão: Veredas não tem bons personagens, ou personagens memoráveis, etc etc. Seria um absurdo. Estou falando que, em comparação a esses outros 4 do meu top5, que são os romances mais perfeitos da humanidade, na minha opinião, Grande Sertão: Veredas tem menos personagens, etc.
Para todos os fins e efeitos, considero esses 5 romances perfeitos: tudo o que estou falando aqui que pode soar crítica só é crítica na comparação entre eles.
Um atleta que corra os cem metros rasos em 5 décimos de segundo a mais que o Usain Bolt já não é um dos homens mais rápidos do mundo, mas certamente é mais rápido que todas nós, várias vezes. Não é um cara lento.
Assim como, digamos, Guerra e Paz não tem um final ruim, mas sim um final que não está à altura da excelência do romance como um todo.
(Em tempo, ainda no assunto aviso: os números do exemplo do Usain Bolt foram claramente inventados aleatoriamente. Por favor, não seja a pessoa que vai desmascarar a própria chatice vindo aqui dizer o tempo exato que é necessário para alguém perder para o Bolt e ainda assim ser um atleta de alta performance etc etc. Se eu considerasse isso minimamente importante, ou se fosse relevante para o meu exemplo, eu mesmo teria descoberto em 3 segundos no Google, mais rápido do que demorei pra escrever esse aviso anti-chato. Pelo amor do bom Deus, não sejam essa pessoa por aí.)
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O estilo do vento
Se vamos manter a metáfora, que eu nem sabia pra onde ia quando comecei!, ou seja, se a floresta são os grandes temas, se as folhas são as pessoas humanas, então o estilo seria o quê? O vento que corre entre as folhas e balança a floresta? A floresta e as folhas são belas mesmo sem vento? Claro que sim. São ainda mais belas, mais vivas, mais sedutoras com o vento soprando por entre elas? Sempre.
Então, se Grande Sertão: Veredas tira a pior nota dos 5 em um critério importante (amplidão humana?), ele tira a melhor nota possível em outro critério essencial que eu também não saberia definir… Ambição linguística? Prosa poética? Invencionice vocabular? Estilo do vento?
Mas, enfim, resta o fato de que considero que a literatura é feita de língua e a língua precisa apanhar todo dia pra saber quem manda (obrigado, Veríssimo): ela precisa ser amada e mimada, puxada e empurrada, liberada e domesticada, exaltada e contida, reprimida e esticada, derramada e moldada, tudo isso, o tempo todo. Cada artista tem o seu material, os bloquinhos de Lego que usa para construir sua visão: na literatura, nossos bloquinhos são as palavras, os fonemas, a própria língua que usamos.
(Como tudo nesse texto, mais uma vez, essa é a minha leitura muito pessoal, etc etc.)
Nesse aspecto, naturalmente, Grande Sertão: Veredas ganha por WO. Os outros 4 nem mesmo tentam, ou tentam muito timidamente. Via de regra, todos os livros realmente inovadores em estilo, que tentam buscar o limite de suas línguas e esticá-los, tendem a ser curtos, e só podem ser realmente apreciados no original. Quase sempre, monumentalidade na visão e originalidade no estilo não caminham juntos.
O melhor exemplo brasileiro é Água Viva, da Lispector, que mal tem 100 páginas e seria intolerável mais longo. Hoje em dia, quem melhor faz isso com a língua portuguesa não está no Brasil: são Lobo Antunes, em Portugal, e Mia Couto, em Moçambique, e considero que são infinitamente mais bem-sucedidos em seus textos curtos do que nos romances longos.
Um raro livro que claramente tem a ambição de tentar abarcar a totalidade do mundo e da existência, a intenção de ser inovador no estilo, e, ainda por cima, a audácia de ser longo, é Os Passos Perdidos, de Carpentier, que li há pouco tempo e não me sai da cabeça. Mas, como seu contemporâneo Grande Sertão: Veredas (um é de 1953, outro, de 1956), seu ponto mais fraco é na amplidão humana: não me saem da cabeça as questões que o romance coloca, tudo o que me ensinou sobre o lugar problemático na América Latina dentro da cultura ocidental, assim como a fantasmagoria de suas inigualáveis descrições da natureza amazônica … mas não as personagens em si, que não me pareceram particularmente lembráveis.
Não por acaso, Rosa e Carpentier são autores celebrados merecidamente em suas próprias línguas nacionais, mas cuja força, em larga medida, se perde na tradução — Rosa bem mais que Carpentier.
(Um texto muito interessante sobre o fracasso da tradução de Os Passos Perdidos para o inglês, e que diz muito sobre como deve ter sido o processo de Grande Sertão: Veredas também.)
Nas décadas de 1950 e 1960, vivia-se, no cenário da literatura ocidental, o que se chamou de “boom latinoamericano”. Foi quando estouraram para o mundo autores como Cortazar, Garcia Marquez, Vargas Llosa. É nesse cenário que são lançados Os Passos Perdidos, em 1953, e Grande Sertão: Veredas, em 1956. Nos EUA, apostando no boom, ambos são lançados pela mesma editora, Knopf, traduzidos pelas mesmas pessoas… e sofrem o mesmo fracasso comercial.
Se quisermos saber como seria Grande Sertão: Veredas sem a voz única de Riobaldo (como seria Riobaldo sem a voz de Riobaldo!), é só ler essa tradução.
Enfim, se a pior omissão de Grande Sertão: Veredas, em comparação ao resto do meu top5, é a relativa falta de fofoca humana, o romance mais do que compensa pela exuberância vocabular. Por mostrar que a língua, mais especificamente essa língua portuguesa, essa linguinha periférica que nós usamos pra pedir café no boteco e falar putaria na cama, pode ser, em si mesma, arte; pode ser, em si mesma, talvez a personagem mais importante da história.
Pode ser, no futuro longínquo, quando o português for língua morta, quando já não tiver pessoa humana que sussurre sem-vergonhice em português no ouvido de outra, que ainda existam pessoas aprendendo e lendo português… só para poder apreciar Grande Sertão: Veredas no original.
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Então, ó, sei lá, mas escrevi e escrevi e escrevi, são uma da tarde e estou escrevendo desde oito da manhã, pensei e comparei, me justifiquei e me expliquei, mas hoje, quinta, 23 de setembro de 2021, na empolgação de ter terminado a terceira leitura de Grande Sertão: Veredas (as anteriores foram em 1998 e em 2016), estou super achando, sim!, que talvez seja o romance perfeito. Melhor que Moby Dick. Melhor que Os Miseráveis. Melhor que Guerra e Paz. Melhor que Cem Anos de Solidão.
E cerro aqui, mire e veja. Fica aí essa bomba, vocês que lutem. Travessia.
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Literatura intraduzível
A beleza de Grande Sertão: Veredas só faz sentido em português.
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Já ouvi de várias pessoas literatas russas:
“Vocês, ocidentais, gostam tanto de Tolstoi e Dostoievski só porque não conseguem ler Púchkin e Turgeniev no original. Tolstoi e Dostoievski, apesar de maravilhosos, claro, são puro enredo, e estripulias de enredo – seja Pierre na Evacuação de Moscou, ou de Raskolnikov depois de matar a velha – são facilmente traduzíveis. Mas Púchkin e Turgeniev são grandes autores não apenas pelos enredos mas pela mágica que realizavam com a língua russa, pela poesia do estilo, pela escolha de vocabulário, pelos jogos de palavras. Como tudo isso se perde para vocês, é natural que prefiram Tolstoi e Dostoievski.”
Uma pessoa estrangeira que leu a nossa literatura em tradução poderia dizer:
“Não entendo o alarde que vocês fazem com Grande Sertão: Veredas. É legal, uma bela historinha de cowboys e crossdressing décadas antes de Brokeback Mountain, mas, sério, não chega aos pés de Machado de Assis e Clarice Lispector.”
Estilos límpidos ou racionais, intelectuais ou concisos, como Machado ou Kafka, Tchecov ou Borges, se traduzem com razoável facilidade. Ler um conto de Machado ou de Borges no original ou em tradução não são experiências fundamentalmente diferentes: tudo aquilo que faz deles grandes escritores é transmitido, perde-se quase nada da magia, da arte, do valor.
Até mesmo Clarice Lispector, que buscava descobrir os limites daquilo que não era possível ser dito, é surpreendente traduzível. Sua obra-prima, Água viva, é um dos textos mais impressionantes jamais escritos em português. Eu o considerava intraduzível… até lê-lo em tradução. Para minha surpresa, as traduções conseguem transmitir quase tudo daquilo que faz o livro ser impressionante.
Apesar de Lispector estar sempre buscando as fronteiras daquilo que pode ser dito, ela é muito mais traduzível do que Guimarães Rosa, por um motivo simples: Lispector estava dialogando com a Língua com L maiúsculo, um diálogo que poderia se dar de maneira bem semelhante em húngaro ou grego, enquanto Guimarães Rosa estava dialogando com a própria brasilidade da língua portuguesa.
Dá pra imaginar uma autora belga ou chinesa produzindo uma obra semelhante ou equivalente a de Lispector, guardadas pequenas diferenças regionais, mas um Guimarães Rosa não-brasileiro não faria nenhum sentido.
A beleza de Grande Sertão: Veredas é que ele só pode ser fruído em sua totalidade em português, um pequeno tesouro só nosso.
Abaixo, para exemplificar, algumas traduções de Água viva e de Grande Sertão: Veredas.
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Água viva (1977), de Clarice Lispector. Segundo parágrafo:
“Eu te digo: estou tentando captar a quarta dimensão do instante-já que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais. Cada coisa tem um instante em que ela é. Quero apossar-me do que é da coisa. Esses instantes que decorrem no ar que respiro: em fogos de artifício eles espocam mudos no espaço. Quero possuir os átomos do tempo.”
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Elizabeth Lowe e Earl Fitz, 1989:
“Let me tell you… I’m trying to capture the fourth dimension of the now-instant, which is so fleeting it no longer is because it has already become a new now-instant, which also is no longer. Each thing has an instant in which it is. I want to take possession of the thing’s is. Those instants that elapse in the air I breathe: in fireworks exploding silently in space. I want to possess the atoms of time.”
Transmite muito bem a estranheza do original.
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Elena Losada, 2004:
“Te digo: estoy intentando captar la cuarta dimensión del instante-ya, que de tan fugitivo ya no existe porque se ha convertido en un nuevo instante-ya que ahora tampoco existe. Quiero apoderarme del es de la cosa. Esos instantes que transcurren en el aire que respiro, como fuegos artificiales estallan mudos en el espacio. Quiero poseer los átomos del tiempo.”
Domestica e corrige um pouco, mas ainda assim muito bom.
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Stefan Tobler, 2012:
“Let me tell you: I’m trying to seize the fourth dimension of this instant-now so fleeting that it’s already become a new instant-now that’s already gone. Everything has an instant in which it is. I want to grab hold of the is of the thing. These instants passing through the air I breathe: in fireworks they explode silently in space. I want to possess the atoms of time.”
A melhor.
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Grande Sertão: Veredas (1956), de Guimarães Rosa. As primeiras linhas na narração do jagunço Riobaldo.
“Nonada. Tiros que o senhor ouviu foram de briga de homem não, Deus esteja. Alvejei mira em árvores no quintal, no baixo do córrego. Por meu acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde mal em minha mocidade. Daí, vieram me chamar. Causa dum bezerro: um bezerro branco, erroso, os olhos de nem ser – se viu –; e com máscara de cachorro. Me disseram; eu não quis avistar. Mesmo que, por defeito como nasceu, arrebitado de beiços, esse figurava rindo feito pessoa. Cara de gente, cara de cão: determinaram – era o demo. Povo prascóvio. Mataram. Dono dele nem sei quem for. Vieram emprestar minhas armas, cedi. Não tenho abusões. O senhor ri certas risadas… Olhe: quando é tiro de verdade, primeiro a cachorrada pega a latir, instantaneamente – depois, então, se vai ver se deu mortos. O senhor tolere, isto é o sertão. Uns querem que não seja: que situado sertão é por os campos-gerais a fora a dentro, eles dizem, fim de rumo, terras altas, demais do Urucuia. Toleima. Para os de Corinto e do Curvelo, então, o aqui não é dito sertão?”
Reparem como, para nós, falantes nativas de português, o texto nos soa absurdamente estranho. E não é porque em Minas se fala assim, mas porque o autor propositalmente inventou essa língua. Então, a primeira tarefa de uma tradutora será recriar essa mesma estranheza no idioma de destino.
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James L. Taylor e Harriet de Onís, 1963:
“It’s nothing. Those shots you heard were not men fighting. God be praised. It was just me there in the back yard, target-shooting down by the creek, to keep in practice. I do it every day, because I enjoy it; have ever since I was a boy. Afterwards, they came to me about a calf, a stray white one, with the queerest eyes, and a muzzle like a dog. They told me about it but I didn’t want to see it. On account of the deformity it was born with, with lips drawn back, it looked like somebody laughing. Man-face or dogface: that settled it for them; it was the devil. Foolish folk. They killed it. Don’t know who it belonged to. They came to borrow my gun and I let them have it.
You are smiling, amused-like. Listen, when it is a real gunfight, all the dogs start barking, immediately — then when it’s over you go to see if anybody got killed. You will have to excuse it, sir, but this is the sertão. Some say it’s not — that the real sertão is way out yonder, on the high plains, beyond the Urucúia River. Nonsense. For those of Corinto and Curvelo, then, isn’t right here the sertão?”
Aqui, dá pra ver que as tradutoras simplesmente entregaram os pontos. Não fizeram nenhuma tentativa de verter o estilo de Rosa e se mantiveram ao enredo. A prosa em inglês, com um ou dois estranhismos, é correta. Além disso, inventaram uma quebra de parágrafo que não existia.
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Felipe W. Martinez, 2013:
“Nonothing. Shots that the Sir heard were man brawling not, God be. Bleach white sights on the tree in the backyard, down in the river. By my right. I do this every day, I like; from the bad of boyhood. Thereof they came to call on me. Case of a calf: a white calf, errorful, eyes of to not be—saw selves—; and with a mask of a dog! They told me; I didn’t want to catch a sight. Same that, by the defects of birth, upturned lips, looked to be a laughing man. Folkface, dogface: they determined—it was the devil. Bananas. Killed it. Do not know who owned it. They came to borrow my guns. I caved. I’ve no power to impose. Oh, sir, you laugh certain laughs…Look: when it’s a true shot, first the dogs begin to bark, instantly—after, then, you see who’s handed death. Sir, endure, this is the Sertão. Some want that it is not: that situated Sertão is in and out of those general fields, they say, end of the road, highlands, the other Urucuia. Toleima. For those of Cortino and of Curvelo, then, isn’t here said Sertão?”
Martinez pelo menos tenta. Mas consegue? O “thereof” me parece completamente deslocado. As frases sem sujeito em inglês soam mais estranhas e mais erradas ao ouvido anglófono do que qualquer coisa que Riobaldo fala em português. Pessoalmente, achei desconjuntado demais, mas reconheço o esforço.
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Alison Entrekin, 2016:
“Nonought. Shots you heard weren’t a shootout, God be. I was training sights on trees in the backyard, at the bottom of the creek. Keeps my aim good. Do it every day, I enjoy it; have since the tenderest age. Anyhow, folks came calling. Bout a calf: white one, strayling, eyes like no thing ever seen and a dog’s mask. They told me; I didn’t want to see. Seems it was defective from birth, lips curled back, and looked to be laughing, personlike. Human face, hound face: they decided — it was the devil. Oafenine bunch. They killed it. Nought a clue bout the owner. They came to beg my guns, I let em. I’m not superstitious. You got a way of laughing, sir… Look: when shots are for real, first the dogs set up barking, that instant — then you go see if anyone’s dead. Don’t mind, sir, this is the sertão. Some reckon it in’t: the backlands are further off, they say, the campos-gerais inside and out, back-o-beyond, high plains, far side of the Urucúia. Lottarot. To folks in Corinto and Curvelo, in’t this here the sertão?”
Minha preferida. Mantém toda a estranheza, neologismos e jogos de palavras de Rosa, com um tantinho mais de fluência narrativa. Gosto de como ela diz “backlands” depois de “sertão”, meio explicando, meio mostrando, meio definindo dentro do próprio texto o que é “sertão”, essa palavra que sua pessoa leitora provavelmente não conhece.
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Angél Crespo, 1967:
“Nonada. Los tiros que usted ha oído han sido no de peleas de hombres, Dios nos asista. Apunté a un árbol, en el corral, en el fondo del barranco. Para estar en forma. Todos los días lo hago, me gusta; desde apenas en mi mocedad. Entonces, fueron a llamarme. Por mor de un becerro: un becerro blanco, defectuoso, los ojos de no ser —habráse visto— y con careta de perro. Me lo dijeron; yo no quise verlo. Incluso que, por desperfecto de nación, remangado de hocidos, parecía reírse como persona. Cara de gente, cara de can: decidieron que era el demonio. Gente parva. Lo mataron. Dueño suyo, no sé quién fuese. Vinieron a que les prestase mis armas, se las cedí. No tengo supersticiones. El señor ríe ciertas risotadas… mire: cuando es tiro de verdad, primero la jauría empieza a ladrar, instantáneamente; después, se va entonces a ver si hubo muertos. El señor apechuque, esto es el sertón. Algunos quieren que no lo sea: que situado está el sertón por los campos generales de fuera a dentro, dicen ellos, al final de los rumbos, en las tierras altas, más allá del Urucuia. Tontunas. Entonces, para los de Corinto y del Curvelo ¿esto de aquí no es llamado sertón?”
O tradutor era poeta e essa tradução é conhecida por respeitar o lado experimental do texto. Mas, se é verdade, não dá pra ver isso nesse trecho. Pelo contrário, como na primeira tradução anglófona, o texto me parece ter sido domado e simplificado. Cadê a estranheza, os neologismos, as quebras bruscas?
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Florencia Garramuño e Gonzalo Aguilar, 2011:
“–Nonada. Los tiros que usted oyó no fueron de pelea de hombre, no, Dios me libre. Le apunté a un blanco en el árbol, en el corral, en la bajada del arroyo. Para practicar. Lo hago todos los días, me gusta; desde que era bien joven. Por eso me vinieron a buscar. Por causa de un ternero: blanco, defectuoso, con ojos de no ser; y con semblante de perro. Me dijeron; yo no quise mirarlo. Tanto que, por defecto como nació, con el hocico arremangado, cuando se reía parecía persona. Cara de gente, cara de perro; decidieron: era el diablo. Pueblo ignorante. Lo mataron. Ni sé quién era su dueño. Vinieron a pedirme mis armas; se las di. Yo supersticioso no soy. Usted se ríe de una manera… Mire: cuando es tiro de verdad, primero la jauría empieza a ladrar, instantáneamente. Después, ahí se va a ver si hubo muertos. Hay que aguantarse; así es el Sertón. Algunos quieren que no lo sea: que el Sertón está cercado de mesetas de afuera hacia adentro, dicen, al final del rumbo, en tierras altas, más allá del Urucuia. Bobadas. Para los de Corinto y de Curvelo, entonces, ¿lo de acá no es Sertón?”
Um pouco melhor que a outra, mas, ainda assim, muito domesticada, normalizada. A leitora hispânica não tem acesso a um décimo da estranheza do original.
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No geral, as duas traduções hispânicas e a primeira anglófona me parecem domesticar excessivamente o texto rosiano, enquanto a segunda anglófona (Martinez) complica demais. Entrekin chega mais perto de um delicado e instável equilíbrio. Ela é uma australiana, que mora em Santos, e ainda não publicou sua tradução, somente liberou alguns trechos na internet. E me disse, pelo Facebook, que a tradução deve sair nos EUA pela Knopf e no Reino Unido pela Cape e que ela continua firme e forte trabalhando.
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Naturalmente, os contos de Machado são machadianos, os de Tchecov, tchecovianos, os de Kafka, kafkianos. Todo grande autor cria um gênero em si mesmo. Mas, na prática, muitos outros autores escreviam como Machado, como Tchecov, até mesmo como Kafka. O estilo também poderia ter sido nomeado a partir de qualquer um deles: somente aconteceu de Machado, Tchecov, Kafka terem sido melhores, mais famosos, mais representativos.
Mas, se Borges é borgiano e Guimarães Rosa, rosiano, ninguém nunca mais foi. Pelo menos, não com sucesso. Impossível imaginar qualquer outra pessoa escrevendo com o mesmo mix de ingredientes que caracteriza a prosa borgiana e a prosa rosiana.
(Publiquei uma resenha na Folha de São Paulo defendendo que o melhor continuador de Guimarães Rosa, hoje, é Mia Couto.)
Durante muitos anos, a principal batalha de uma jovem pessoa escritora argentina e brasileira era contra suas próprias pulsões borgianas e rosianas. Tentar copiar esses mestres era tão irresistível quanto fatal: sem superá-los, seria impossível encontrar a própria voz.
(O escritor polonês Witold Gombrowicz, que morou na Argentina por vinte e cinco anos, ao deixar o país definitivamente, já no navio, gritou para os colegas portenhos em terra: “Matem Borges!“)
Hoje em dia, no Brasil, ninguém mais imita Guimarães Rosa, mas até a década de oitenta, muitas pessoas ainda cometiam péssimos livros nessa vã tentativa.
Mais bem-sucedidas foram as pessoas que se fizeram escritoras imitando o estilo de Rubem Fonseca – um estilo que, no próprio criador, depois de três ou quatro livros, já tinha virado um pastiche de si mesmo. (Gosto de tudo que escreveu até Feliz Ano Novo, de quase nada depois.)
Felizmente, ambos os pastiches, o rosiano e o fonsequiano, saíram de moda faz tempo.
Se ainda existe algum risco atual na literatura brasileira é imitar Clarice Lispector. Água viva é um dos romances mais brilhantes jamais escritos em qualquer língua, mas só dá para ser escrito uma única vez.
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Guimarães Rosa e Homero
Em nossa literatura, Os sertões seria a Ilíada, uma duríssima história de guerra, narrada por um vencedor que termina glorificando os vencidos, e Grande Sertão: Veredas, a Odisséia, as mil aventuras de um guerreiro até chegar em casa.
Não sei se concordo. Grande Sertão: Veredas, seguramente melhor que a Odisséia, é na verdade mais similar à Ilíada, se não em enredo, pelo menos no tom.
A Ilíada é o épico perfeito, uma síntese dos valores guerreiros da Antiguidade. Já a Odisséia tem um tom mais contido, moderno, doméstico. (Não é modo de falar: o livro traz descrições da vida doméstica grega que são documentos históricos valiosos.) Ninguém na Ilíada seria concebível como um homem moderno. O Ulisses da Odisséia, sim. Soltem Aquiles na Cinelândia hoje e ele vai acabar preso. Soltem Ulisses e vai acabar deputado.
Se quiséssemos comparar Grande Sertão: Veredas com as obras homéricas, eu diria que é uma Ilíada brasileira, narrada (mais ou menos) pelo Ulisses da Odisséia.
Uma das principais características do romance moderno (ensinou Lukacs) é o protagonista deslocado. Não existe romance possível se o protagonista não está, de alguma maneira, fraturado de seu ambiente, de sua vida, das pessoas a sua volta. Não é o caso da Ilíada: nela, ninguém está deslocado; o mundo é o que é e pronto. Já a Odisséia poderia ser considerada um proto-romance: as aventuras de um narrador deslocado e perdido, tentando voltar pra casa. Naturalmente, se o Ulisses da Odisséia está mais próximo a nós do que o Aquiles (ou qualquer pessoa) da Ilíada, ele ainda assim não é um de nós. Mas Riobaldo é.
Em Grande Sertão: Veredas, o mundo jagunço movido a honra e violência é um universo tão estilizado e tão literário quanto o mundo dos heróis da Ilíada ou de qualquer épico cavalheiresco medieval. Com exceção de Riobaldo, alter-ego da pessoa leitora, todos as outras personagens parecem muito confortáveis e adaptadas a esse ambiente, inclusive Diadorim.
Aliás, a grande tragédia no cerne do romance é a incapacidade de Riobaldo de transmitir esse seu estranhamento e deslocamento a Diadorim, retirando-o desse mundo e salvando sua vida. Assim como Aquiles, que teve todas as chances de abandonar o combate, voltar para casa e ter vida longa, Diadorim escolhe conscientemente o ódio e a vingança.
Grande Sertão: Veredas é o que aconteceria com a Ilíada se ela se passasse no sertão e Aquiles fosse um homem do século XX, introspectivo e alfabetizado, capaz de refletir sobre o Bem e Mal, capaz de escolher a vida e não a morte.
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“Escrever é muito perigoso. Carece ter coragem.”
Quando criticavam Guimarães Rosa por escrever difícil, ele respondia:
“Eu não escrevo difícil: eu sei o nome das coisas.”
Em 1952, quatro antes antes da publicação de Grande Sertão: Veredas, Rosa acompanhou oito vaqueiros e trezentas cabeças de gado em uma viagem de dez dias por 250km do sertão de Minas Gerais.
Durante a viagem, ele trazia um caderninho pendurado no pescoço e ia anotando o nome de tudo.
Décadas mais tarde, muito depois da morte do escritor, um dos vaqueiros confessou que os nomes eram quase todos falsos:
“Nonada. Essas palavras que o senhor leu foram palavras de verdade não. Inventamos inventados muitos nomes. Mire e veja: é que dotô Rosa, escrevinhador grão-neologista, não fornecia paz, insistia e reinsistia, lançava perguntas e questionamentos: ‘Como se chama-nomeia esse arbusto?’ E eu desfalava: ‘Gloso não. É só arbusto que só. Nada mais.’ Mas dotô Rosa, Deus o possua, parecia que tinha pacto com o Arrenegado, que era aluno do Cramulhão, que queria o dicionário de sinônimos do Não-sei-que-diga, e se arrebelava contra nós: ‘Povo prascóvio! Como não sabem o nome-chamador de um arbusto que passam cavalgando todo dia! Toleima!’ Mas passarinho que se debruça – o vôo já está pronto! Pois o senhor entenda, então nós inventava: ‘Anote aí bem escritinho, dotô Rosa, o arbusto se conhece-chama por Azarapê-de-pau-lustroso.’ E ele anotava tudo, felizinho de aprazível. O senhor tolere, isto é o sertão. Escrever é negócio muito perigoso: carece de ter vocabulário. Carece de ter muito vocabulário.”
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Obrigado a Luis Fernando Veríssimo que, em 1996, em comemoração aos 40 anos de publicação de Grande Sertão: Veredas, escreveu uma crônica sobre o livro: “Feitiço”. (Hoje, essa crônica pode ser encontrada no livro A eterna privação do zagueiro absoluto.) Impulsionado por essa generosa crônica, onde Veríssimo pede que ninguém abandone o livro antes da décima página, para dar tempo de sua mágica funcionar, eu li o livro e me apaixonei. A mágica funcionou.
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Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa é um texto no site do Alex Castro, publicado no dia 6 de outubro de 2021, disponível na URL: alexcastro.com.br/grande-sertao-veredas-de-guimaraes-rosa // Sempre quero saber a opinião de vocês: para falar comigo, deixe um comentário, me escreva ou responda esse email. Se gostou, repasse para as pessoas amigas ou me siga nas redes sociais: Newsletter, Instagram, Facebook, Twitter, Goodreads. // Todos os links de livros levam para Amazon Brasil. Clicando aqui e comprando lá, você apoia meu trabalho e me ajuda a escrever futuros textos. // Tudo o que produzo é sempre graças à generosidade das pessoas mecenas. Se gostou, considere contribuir: alexcastro.com.br/mecenato
2 respostas em “Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa”
[…] pessoas fluentes em espanhol contemporâneo, é um como ler Grande Sertão: Veredas para nós: é a mesma língua, mas em outro registro. Demora um pouco pra se acostumar mas, quem […]
Na sua lista de contribuições brasileiras a literatura universal, lá no começo do texto, você omitiu o maior poeta lógico do mundo desde Heráclito de Éfeso: João Cabral de Melo Neto, pernambucano do Recife, recifense da Jaqueira, na margem direita do Rio Beberibe, que todo mundo sabe que desagua no Guadalquivir, Sevilha, Andaluzia.
É inadmissível essa omissão, quanto mais vindo de você, Alex…
(outra: na comparação de Rosa com seus pares hispano-americanos você não elemenca o maior na sua miudeza: Juan Carlos Nepumuceno Rulfo Viscayno – ou Pedro Páramo não é o melhor romance curto de todos os tempos?, e com efeito de romance longo, daqueles que a gente encerra, concluí, mas dele jamais sai…?!)