A experiência de ir ao teatro na Grécia Antiga era tão diferente da nossa que é difícil até nos colocarmos nesse lugar.
O teatro, na Grécia Antiga, era uma atividade religiosa. As peças eram encenadas como parte de um festival anual em homenagem à Dioniso, por volta de março ou abril, celebrando o fim do inverno e o começo da primavera. (Mais tarde, a Igreja colocará a Páscoa mais ou menos nessa mesma época, para competir com festivais semelhantes.)
Atenas recebia milhares de pessoas, vindas de suas áreas rurais e do resto da Grécia, para celebrar Dioniso. As tragédias, assim como várias procissões e cerimônias, eram parte integrante desse ritual religioso. Cada autor (que também era ator, diretor, coreógrafo, produtor) apresentava uma trilogia de tragédias e uma peça satírica, financiadas por algum cidadão rico e ensaiadas por seis meses. (A única trilogia sobrevivente é a Orestéia.) Por três dias, em um anfiteatro com capacidade para vinte mil pessoas, os cidadãos assistiam a diversas peças na sequência e, por fim, votavam na melhor trilogia. A competição, como tudo na Grécia, era intensa: Euripides, menos popular entre os três grandes, ganhou apenas quatro vezes. Vencedoras ou perdedoras, as peças eram encenadas essa única vez — salvo ocasionais exceções.
Originalmente, as peças eram formadas apenas pelo coro, que cantava. Téspis, considerado o primeiro ator, teria tido a ideia de acrescentar uma pessoa para interagir com o coro. Ésquilo, considerado o criador do teatro, acrescentou mais um ator para interagir com o primeiro. Nas peças mais antigas, o coro era mais importante e, gradualmente, ele vai perdendo importância em detrimento da ação entre os atores. Ainda assim, das quatro tragédias que leremos, o coro dá nome a três e é parte integrante da ação: As coéforas, As eumênides, As bacantes.
Só homens podiam atuar mas mulheres podiam assistir as peças. (Um autor registra que, quando a Orestéia foi encenada, a aparência das Fúrias era tão terrível que várias mulheres na platéia abortaram na hora. Naturalmente, não precisamos acreditar nisso para registrar a informação de que, a não ser que mulheres pudessem assistir as peças, esse relato nem faria sentido.)
Para podermos visualizar as peças, é importante saber que o coro sempre falava cantando e, muitas vezes, dançava. Todos os atores estavam sempre de máscaras que cobriam totalmente o rosto: eles atuavam com a impostação da voz e com os movimentos do corpo. Por fim, embora o coro variasse muito de tamanho (há relatos de coros de dezenas, ou centenas, de pessoas), o número de atores era sempre pequeno, dois ou três, que se alternavam nos diversos papeis, apenas trocando de máscara.
De tantas peças escritas, montadas, celebradas, assistidas em honra a Dioniso, só nos restou uma única onde Dioniso é, ele mesmo, protagonista: As bacantes.
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Esse texto faz parte dos guias de leitura para a segunda aula, Gregos, do meu curso Introdução à Grande Conversa: um passeio pela história do ocidente através da literatura. Esses guias são escritos especialmente para as pessoas alunas, para responder suas dúvidas e ajudar em suas leituras. Entretanto, como acredito que o conhecimento deve ser sempre aberto e que esses textos podem ajudar outras pessoas, também faço questão de também publicá-los aqui no site. Todos os guias de leitura da primeira aula estão aqui. O curso começou no dia 2 de julho de 2020 — quem se inscrever depois dessa data terá acesso aos vídeos das aulas anteriores.
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Tragédia grega: rápida introdução é um texto no site do Alex Castro, publicado no dia 21 de julho de 2020, disponível na URL: alexcastro.com.br/tragedia-grega // Se gostou, repasse para as pessoas amigas ou me siga nas redes sociais: Newsletter, Instagram, Facebook, Twitter, Goodreads. Esse, e todos os meus textos, só foram escritos graças à generosidade das pessoas mecenas. Se gostou muito, considere contribuir: alexcastro.com.br/mecenato