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Romanceiro do Cid, em português

Das muitas obras literárias estreladas pelo heroi medieval El Cid, as poesias de cordel talvez seja as mais tradicionais e as mais belas. (Guia de Leitura do curso Grande Conversa Espanhola.)

Das muitas obras literárias estreladas pelo heroi medieval El Cid, as poesias de cordel talvez seja as mais tradicionais e as mais belas.

Rodrigo Díaz del Vívar, conhecido como El Cid, é um dos personagens mais famosos e importantes da cultura espanhola, centro de um vasto universo mitológico. (Ele, falecido em 1099, realmente existiu, e boa parte dos personagens de seu “universo” também, mas todos foram incessantemente ficcionalizados pelos últimos mil anos.)

El Cid é personagem não só do poema épico medieval, escrito por volta do século XIII, que leremos na 1ª aula do curso Grande Conversa Espanhola, mas também de diversos “romances” posteriores (o que nós chamamos de “cordel”, ou seja, poesias narrativas) que provavelmente circularam oralmente durante a Idade Média e, depois, foram compilados por escrito no século XVI.

Abaixo, em espanhol e em português, quatro romances que têm o Cid como personagem principal, ambos retirados de Romances viejos do romancero español: análise e tradução, dissertação de mestrado em Letras da UFMG, defendida por Elsa Liliana Tironi de Souza Prado em 2016.

* * *

Contexto histórico

Ao morrer, o rei Fernando I (1016-1065), de Leão, dividiu suas possessões entre seus filhos da seguinte maneira: a primogênita, Urraca, impedida de ser rainha pelos costumes locais, ficou com a cidade de Zamora; seu filho primogênito, Sancho herdou Castela; Alfonso, Leão (em português, Afonso); Garcia, Galícia (inclusive Portugal, que ainda não era independente).

Sancho, insatisfeito com a divisão, pois acreditava que, como primogênito, deveria ser o único rei de todas as possessões, começou a guerrear contra cada um de seus irmãos. Rodrigo Díaz de Vivar, o El Cid, era um de seus principais líderes militares.

Sancho primeiro derrotou Garcia (1071), que aprisionou, tornando-se assim rei também da Galícia; depois, derrotou e capturou Alfonso (1072), que permitiu, por intercessão de sua irmã Urraca, que se exilasse no reino mouro de Toledo, e tornou-se assim soberano do reino unificado de Castela, Leão e Galícia. (Mas não por muito tempo.)

Na verdade, faltava somente uma cidade, ironicamente onde Sancho havia nascido: Zamora, sob controle de sua irmã Urraca, e onde vários dos nobres descontentes estavam reunidos. Para não deixar essa última pedrinha no seu sapato, nesse mesmo ano, 1072, Sancho cerca a cidade e exige a rendição da irmã.

(A serie El Cid, da Amazon Prime, está justamente mergulhando fundo nessa batalha entre os irmãos. A segunda temporada termina justamente com Sancho começando o cerco de Zamora. A terceira deve estrear em 2022.)

O primeiro romance, “Urraca e Rodrigo”, acontece nesse momento: é um diálogo entre Urraca, senhora da cidade, e Rodrigo, representando o exército sitiante. Esse poema faz parte de uma tradição literária (sem relação com a realidade) na qual Urraca teria sido apaixonada pela Cid e ambos não teriam se unido pela disparidade de posições hierárquicas, fazendo dela uma mulher triste e amargurada. Em algumas obras, como nesse romance, por iniciativa do Cid. Em outros, como na sensacional peça O Cid, de Corneille, por iniciativa de Urraca.

(O Poema do Cid, que vamos ler, e O Cid, de Corneille, são amplamente consideradas as melhores obras de artre do ciclo cidiano.)

Outras duas informações importantes que aparecem nesse romance e que não são comprovadas historicamente: que teria sido Urraca a sagrar o Cid cavalheiro e que isso teria acontecido no templo de Santiago de Compostela.

Voltando à realidade, Sancho é morto à traição durante o cerco de Zamora e Alfonso retorna triunfante de Toledo para herdar o reino que seu irmão mais velho unificara, se tornando assim Alfonso VI (1037-1109), Rei de Leão, de Castela, da Galiza e, mais tarde, “imperador de toda Hispânia”. Urraca se torna sua confidente e uma de suas mais importantes conselheiras.

(Não deixa de ser interessante que um dos maiores e mais famosos reis cristãos da Espanha medieval, derrotado e exilado por seu irmão cristão, tenha tido a experiência de ser acolhido em um reino muçulmano. Reino esse, aliás, que ele conquistou em 1085, depois que o soberano muçulmano que o havia recebido ter sido envenado… por outro muçulmano. As relações entre cristãos e muçulmanos na Espanha medieval eram muito mais entranhadas, complexas, misturadas do que imaginamos hoje.)

Naturalmente, sempre houve alguma suspeita de que talvez Alfonso ou Urraca ou ambos tenham tramado o assassinato de Sancho. O segundo romance, A jura de Santa Gadea, um dos maiores famosos de todo o romanceiro ibérico, é sobre isso, e ainda serve de prólogo ao Poema do Meu Cid.

Enquanto Alfonso está tomando posse como rei na Igreja de Santa Gadea, em Burgos, o guerreiro cabeça-quente El Cid se intromete e exige que ele jure, na frente de todos os nobres, que não teve nada a ver com a morte do irmão. O rei jura, mas acaba exilando o Cid, pela ousadia. O romance termina no momento em que começa o Poema do Meu Cid, com o herói saindo de Burgos.

Como cena dramática, é excelente. Como realidade concebível, nada poderia ser mais improvável. Ela não é citada em nenhuma crônica dos duzentos anos seguintes, surgindo pela primeira vez nas crônicas do século XIV; daí começa a aparecer em romances dos séculos XV e XVI; migra para o teatro do Século de Ouro, no XVII; aparece até no filme hollywoodiano do XX e, enfim, apesar de falsa, acaba se tornando uma das cenas mais famosas da História espanhola.

A cena não só vai contra tudo o que se sabe do Alfonso histórico e do Cid histórico, mas também vai contra o Cid personagem do poema. Enquanto o Cid do Poema do Meu Cid é um cavaleiro maduro e leal, que faz tudo dentro da lei para obter de volta o favor do legítimo soberano, cuja grande qualidade é a mesura e a temperança, o Cid do romanceiro, e desse romance específico, é sempre um jovem cabeça-quente, atrevido, insolente, rebelde, desrespeitoso.

O terceiro romance, “Las almenas del Toro” se passa em algum ponto indefinido da carreira do Cid e parece recordar ou sugerir amores incestuoso entre o rei Alfonso (Alonso?) e a personagem principal, que a tradição considerava ser sua irmã Elvira, raramente mencionada. (Almenas, em espanhol, ou ameias/merlões em português, é isso aqui ó.)

Já o quarto e último romance é um dos poucos que faz referência direta ao Poema do Meu Cid, nesse caso, ao episódio fictício conhecido como a Afronta de Corpes. No terceiro cantar do poema, as filhas do Cid são surradas e abandonadas no meio de uma floresta pelos maridos, os Condes de Carrión. Em resposta, o Cid solicita ao rei que convoque as Cortes para julgá-los — exemplificando assim a sua famosa temperança, já que apela antes à lei que à vingança.

São quatro excelentes exemplos de poesia popular inspirada no personagem Cid que já circulavam pela Espanha no final da Idade Média.

Para maior aproveitamento, leiam em voz alta.

* * *

Urraca y Rodrigo

— Afuera, afuera, Rodrigo, el soberbio castellano.
Acordársete debería de aquel tiempo ya pasado
cuando fuiste caballero en el altar de Santiago,
cuando el rey fue tu padrino, tú, Rodrigo, el ahijado;
mi padre te dio las armas, mi madre te dio el caballo,
yo te calcé las espuelas, porque fueses más honrado,
que pensé casar contigo mas no lo quiso mi pecado.
Casaste con Jimena Gómez, hija del conde Lozano;
con ella hubiste dineros, conmigo hubieras estado;
bien casaste tú, Rodrigo, muy mejor fueras casado:
dejaste hija de rey por tomar de su vasallo.
— Si os parece, mi señora, bien podemos desligallo.
— Mi ánima penaría si yo fuere en discrepallo.
— Afuera, afuera los míos, los de a pie y de a caballo,
pues de aquella torre mocha una vira me han tirado:
no traía el asta de hierro, el corazón me ha pasado;
ya ningún remedio siento, sino vivir más penado.

* * *

Urraca e Rodrigo

Fora, fora, Rodrigo, o soberbo castelhano
Deverias lembrar daquele tempo já passado
quando tornastes cavalheiro no altar de Santiago,
quando o rei foi teu padrinho, tu, Rodrigo, o afilhado;
meu pai te deu as armas, minha mãe te deu o cavalo,
eu te calcei as esporas, para que fosses mais honrado,
pensei em casar contigo, mas infelizmente não foi assim.
Casas-tes com Jimena Gómez, filha do conde Lozano;
com ela terias dinheiro, comigo alcançarias estado;
bem casastes tu, Rodrigo, muito melhor terias casado:
pois deixastes filha de rei para casar com a de seu vassalo.
— Se preferes, minha senhora, bem podemos desfazê-lo.
— Minha alma penaria se eu estivesse de acordo.
— Fora, fora os meus, os que estão a pé e os que estão a cavalo.
pois daquela torre sem capitel me atiraram uma seta:
não trazia a haste de ferro, [mas] o coração me traspassou;
já nenhum remédio sinto, senão viver mais aflito.

* * *

Las almenas del Toro

En las almenas del Toro, allí estaba una doncella
vestida de paños negros, reluciente como estrella.
Pasara el rey don Alonso, namorado se había d´ella.
Dice, si es hija de rey, que se casaría con ella,
y si es hija de duque serviría por manceba.
Allí hablara el buen Cid, estas palabras dijera:
— Vuestra hermana es, señor, vuestra hermana es aquélla.
— Si mi hermana es — dijo el rey —, fuego malo encienda en ella.
Llámenme mis ballesteros, tírenle sendas saetas
y aquel que la errare que le corten la cabeza. —
Allí hablara el buen Cid, de esta suerte respondiera:
— Mas aquel que le tirare pase por la misma pena.
— Íos de mis tiendas, Cid, no quiero que estés en ellas.
— Pláceme — respondió el Cid —, que son viejas y no nuevas;
irm´he yo para las mías que son de brocado y seda,
que no las gané holgando ni bebiendo en la taberna:
ganélas en las batallas con mi lanza y mi bandera.

* * *

As Almenas del Toro

Nas Almenas del Toro, ali estava uma donzela
vestida de panos pretos, reluzente como estrela.
O rei dom Alonso passara, havia se apaixonado por ela.
Diz, se é filha de rei, que se casaria com ela,
e se é filha de duque, serviria como concubina.
Ali falara o bom Cid, dissera estas palavras:
— Vossa irmã é, senhor, aquela é vossa irmã.
— Se minha irmã é — disse o rei —, mau fogo a queime.
Chamem meus flecheiros, atirem-lhe várias setas
e aquele que errar que lhe cortem a cabeça. —
Ali falara o bom Cid, deste modo respondera:
— Mas aquele que lhe atirar, que passe pela mesma pena.
— Ide de minhas tendas, Cid, não quero que estejas nelas.
— Agrada-me -respondeu o Cid-, que sejam velhas e não novas;
ir-me-ei para as minhas que são de brocado e seda,
pois não as ganhei folgando nem bebendo na taverna:
ganhei-as nas batalhas com minha lança e minha bandeira.

* * *

La jura de Santa Gadea

En Santa Águeda de Burgos, do juran los hijos de algo,
allí toma juramento el Cid al rey castellano:
si se halló en la muerte del rey don Sancho su hermano.
Las juras eran muy recias, el rey no las ha otorgado.
— Villanos te maten, Alonso, villanos que no hidalgos,
de las Asturias de Oviedo que no sean castellanos,
si ellos son de León yo te los do por marcados;
caballeros vayan en yeguas, en yeguas que no en caballos;
las riendas traigan de cuerda y no con frenos dorados;
abarcas traigan calzadas y no zapatos con lazo;
las piernas traigan desnudas, no calzas de fino paño;
trayan capas aguaderas, no capuces ni tabardos;
con camisones de estopa, no de holanda ni labrados;
mátente con aguijadas, no con lanzas ni con dardos;
con cuchillos cachicuernos, no con puñales dorados;
mátente por las aradas, no por caminos hoyados;
sáquente el corazón por el derecho costado
si no dices la verdad de lo que te es preguntado:
si tú fuiste o consentiste en la muerte de tu hermano. —
Allí respondió el buen rey, bien oiréis lo que ha hablado:
— Mucho me aprietas, Rodrigo; Rodrigo, mal me has tratado.
Mas hoy me tomas la jura, cras me besarás la mano. —
Allí respondió el buen Cid, como hombre muy enojado:
— Aqueso será, buen rey, como fuere galardonado;
que allá en las otras tierras dan sueldo a los hijos d´algo.
Por besar mano de rey no me tengo por honrado;
porque la besó mi padre me tengo por afrentado.
— Vete de mis tierras, Cid, mal caballero probado;
vete, no m´entres en ellas hasta un ano pasado.
— Que me place — dijo el Cid —, que me place de buen grado
por ser la primera cosa que mandas en tu reinado.
Tú me destierras por uno, yo me destierro por cuatro. —
Ya se partía el buen Cid de Vivar, esos palacios;
las puertas deja cerradas, los alamudes echados,
las cadenas deja llenas de podencos y de galgos;
con él lleva sus halcones, los pollos y los mudados;
con él van cien caballeros, todos eran hijos de algo,
los unos iban a mula y los otros a caballo.
Por una ribera arriba al Cid van acompañando;
acompañándolo iban mientras él iba cazando.

* * *

A jura de Santa Gadea

Em Santa Agueda de Burgos, onde juram os fidalgos,
ali o Cid toma juramento ao rei castelhano:
se estava comprometido na morte do rei dom Sancho seu irmão.
As juras eram muito fortes, o rei não as outorgou.
— Vilões te matem, Afonso, vilões e não fidalgos,
das Asturias de Oviedo, que não sejam castelhanos,
se eles são de León eu os designo para ti;
cavaleiros vão nas suas éguas, nas éguas e não em cavalos;
[que] tragam as rédeas de corda e não com freios dourados;
tragam sandálias calçadas e não sapatos com laço;
tragam as pernas nuas, [e] não calças de pano fino.
vistam capotes, [e] não capas nem tabardos;
com camisas de estopa, não de fino tecido nem bordadas;
que te matem com ferrão, não com lanças nem com dardos;
com facas de chifres, não com punhais dourados;
que te matem pelas searas, não por caminhos lavrados;
que te tirem o coração pelo lado direito
se não dizes a verdade daquilo que te é perguntado:
se fostes tu ou consentistes na morte de teu irmão. —
Ali respondeu o bom rei, ouvireis bem o que falou:
— Apertas-me muito, Rodrigo; Rodrigo, tens-me tratado mal.
Pois hoje me tomas a jura, amanhã me beijarás a mão. —
Ali respondeu o bom Cid, como homem muito enfadado:
— Isso será, bom rei, como me darás galardão;
pois lá nas outras terras dão salário aos fidalgos.
Por beijar mão de rei não me tenho por honrado;
porque a beijou meu pai me tenho por afrontado.
-Saia das minhas terras, Cid, mal cavaleiro provado;
saia, não entre nelas até que tenha passado um ano.
— Agrada-me — disse o Cid —, agrada-me com prazer
por ser a primeira coisa que mandas em teu reinado.
Tu me desterras por um, eu me desterro por quatro. —
Já partia o bom Cid de Vivar, desses palácios;
as portas deixa fechadas, os ferrolhos passados,
as correntes deixa cheias de cães de caça e galgos;
com ele leva seus falcões, os filhotes e os adultos;
com ele vão cem cavaleiros, todos eram fidalgos,
uns iam de mula e os outros a cavalo.
Por uma ribeira acima vão acompanhando o Cid;
acompanhando-o iam enquanto ele ia caçando.

* * *

El Cid en las cortes

Tres cortes armara el rey, todas tres a una sazón:
las unas armara en Burgos, las otras armó en León,
las otras armó en Toledo donde los hidalgos son
para cumplir de justicia al chico con el mayor.
Treinta días da de plazo, treinta días que más no
y el que a la postre viniese que lo diesen por traidor.
Veinte nueve son pasados, los condes llegados son;
treinta días son pasados y el buen Cid no viene, non.
Allí hablaran los condes: — Señor, daldo por traidor. —
Respondiérales el rey: — Eso non faría, non,
qu´el buen Cid es caballero de batallas vencedor
pues que en todas las mis cortes no lo había otro mejor. —
Ellos en aquesto estando, el buen Cid que asomó
con trecientos caballeros, todos hijosdalgo son:
todos vestidos de un paño, de un paño y de una color
si no fuera el buen Cid que traía un albornoz;
el albornoz era blanco, parecía un emperador;
capacete en la cabeza que relumbra como el sol.
— Manténgavos Dios, el rey, y a vosotros sálveos Dios,
que no hablo yo a los condes que mis enemigos son. —
Allí dijeron los condes, hablaron esta razón:
— Nos somos hijos de reyes, sobrinos de emperador;
merescimos ser casados con hijas de un labrador. —
Allí hablara el buen Cid, bien oiréis lo que habló:
— Convidáraos yo a comer, buen rey, tomástelo vos
y al alzar de los manteles dijísteme esta razón:
que casase yo a mis hijas con los condes de Carrión;
diéraos yo en respuesta:
“preguntar lo he yo a su madre, la madre que las parió
preguntar lo he yo a su ayo, al ayo que las crió
Dijérame a mí el ayo: “Buen Cid, no lo hagáis, no,
que los condes son muy pobres y tienen gran presunción”.
Por no deshacer vuestra palabra, buen rey, hiciéralo yo.
Treinta días duraron las bodas, que no quisieron más, no;
Cien cabezas matara de mi ganado mayor,
de gallinas y capones, buen rey, no os lo cuento, no.

* * *

O Cid nas cortes

O rei armara três cortes, todas as três no mesmo momento:
umas armara em Burgos, as outras armou em León,
as outras armou em Toledo onde os fidalgos estão
para fazer justiça ao pequeno com o maior.
Dá trinta dias de prazo, trinta dias nada mais
e aquele que depois viesse que fosse considerado traidor.
Vinte e nove [dias] passaram, os condes chegaram;
trinta dias passaram e o bom Cid não veio, não.
Ali falaram os condes: — Senhor, considerai-o traidor. —
Respondera-lhes o rei: — Isso não faria, não,
pois o bom Cid é cavaleiro vencedor de batalhas
e em todas minhas cortes não havia outro melhor. —
Estando eles nesse preito, o bom Cid apareceu
com trezentos cavaleiros, todos fidalgos são:
todos vestidos de um pano, de uma única cor
se não fosse o bom Cid que trazia um albornoz;
como o albornoz era branco, parecia um imperador;
com o capacete na cabeça que resplandecia como o sol.
— Rei, Deus mantenha-vos, e a vós outros Deus os salve,
pois eu não falo aos condes que são meus inimigos.—
Ali disseram os condes, falaram esta razão:
— Nós somos filhos de reis, sobrinhos de imperador;
merecemos ser casados com filhas de um lavrador. —
Ali falara o bom Cid, ouvireis bem o que falou:
— Eu vos convidei a comer, bom rei, vós aceitastes
e ao levantar as toalhas de mesa me dissestes esta razão:
que eu casasse as minhas filhas com os condes de Carrión;
eu vos dei esta resposta:
“hei de perguntar a sua mãe, a mãe que as pariu;
“hei de perguntar a seu aio, ao aio que as criou”.
O aio disse a mim: “Bom Cid, não o façais, não,
pois os condes são muito pobres e têm grande presunção”.
Para não ir contra vosso desejo, bom rei, eu o fiz.
Trinta dias duraram as bodas, pois não quiseram mais, não;
Cem cabeças matara de meu gado maior,
de galinhas e capões, bom rei, eu não os conto, não.

* * *

Esse texto faz parte dos guias de leitura para a primeira aula, Épica, do meu curso Grande Conversa Espanhola: do El Cid ao Dom Quixote, a invenção da literatura moderna. Esses guias são escritos especialmente para as pessoas alunas, para responder suas dúvidas e ajudar em suas leituras. Entretanto, como acredito que o conhecimento deve ser sempre aberto e que esses textos podem ajudar outras pessoas, também faço questão de também publicá-los aqui no site. Para comprar o curso, clique aqui.

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