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Deus, o Personagem

A vivacidade do Deus-personagem- do-Gênese talvez seja o segredo do sucesso das religiões abrâmicas. (Um guia de leitura para a primeira aula do curso “Introdução à Grande Conversa”.)

Talvez a faceta mais importante de Deus, personagem do Gênese, é o quanto que ele não nos parece em nada moralmente ou espiritualmente superior aos personagens.

Esse é o Deus que quando Sara gargalha dele e, depois, amedrontada, nega, replica: “Riu sim!”, como uma criança amuada (Gen 18, 10-15) Quem é esse personagem-Deus que manda Agar se submeter à sua senhora, mas depois, em seu momento mais desesperador, se deixa ver por ela e a acolhe? Que bane Caim, mas também o protege com sua marca? Deus é tão amplo, tão expressivo, tão contraditório que, realmente, não temos régua para medi-lo. (Bloom 198, 304)

A medida que avançamos no Gênese, e na Bíblia Hebráica, os atributos humanos de Deus vão diminuindo, mas ele continua, até o final, uma consciência e uma personalidade, defendendo Nínive para Jonas já nas vésperas do Novo Testamento. Mais tarde, no desenvolvimento pós-Bíblico das teologias judaica, cristã e muçulmana, Deus torna-se cada vez mais impessoal. Nos textos da Bíblia Hebraica, entretanto, ele é sempre, em maior ou menor grau, personagem, pessoa, consciência. (Bloom 282)

O Deus do Gênese é um grande personagem: transbordante de vida, original, criador, ciumento, parceiro, homicida, tudo, sempre, ao mesmo tempo. Ele não parece ter nada de absoluto, onisciente, onipresente, pelo contrário: parece estar em todos os lugares ao mesmo tempo apenas por força de sua transbordante personalidade. Não parece mais sagrado que nós, seres humanos, somente parece mais: mais vivo, mais energético, mais criativo, mais tudo. (Bloom 295)

Para Harold Bloom, embora Deus talvez seja o personagem mais fraco de Paraíso Perdido (leitura de nossa sétima aula), ele é o maior personagem do Gênese e de toda a Bíblia Hebraica, tão único, tão vivo, tão saliente que talvez seja sua brilhante caracterização literária o motivo desse livro ser sagrado em três das religiões mais bem-sucedidas de todos os tempos. (Bloom 198, 317)

(Referências: O Livro de J, de Harold Bloom.)

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Esse texto faz parte dos guias de leitura para a primeira aula, Antigo Testamento, do meu curso Introdução à Grande Conversa: um passeio pela história do ocidente através da literatura. Esses guias são escritos especialmente para as pessoas alunas, para responder suas dúvidas e ajudar em suas leituras. Entretanto, como acredito que o conhecimento deve ser sempre aberto e que esses textos podem ajudar outras pessoas, também faço questão de também publicá-los aqui no site. Todos os guias de leitura da primeira aula estão aqui. O curso começou no dia 2 de julho de 2020 — quem se inscrever depois dessa data terá acesso aos vídeos das aulas anteriores.

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Deus, o personagem é um texto no site do Alex Castro, publicado no dia 26 de junho de 2020, disponível na URL: alexcastro.com.br/deus-o-personagem // Se gostou, repasse para as pessoas amigas ou me siga nas redes sociais: Newsletter, Instagram, Facebook, Twitter, Goodreads. Esse, e todos os meus textos, só foram escritos graças à generosidade das pessoas mecenas. Se gostou muito, considere contribuir: alexcastro.com.br/mecenato

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