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deixa eu falar

uma peixaria na lapa, terça à noite, mesas na calçada. o moço repetia em altos brados: “deixa eu falar, deixa eu falar”. e falava. a moça à sua frente, loira, mais alta, mais paciente, nunca abria a boca. mesmo assim, daqui a pouco, ele bradava de novo: “deixa eu falar, deixa eu falar.” e falava mais. ela só sorria.

Uma resposta em “deixa eu falar”

Alex, te colo um trecho desse livro que eu gosto muito e que eu me lembrei assim que li esse seu texto. O livro é “O livro do Riso e do Esquecimento”, do Milan Kundera:

“Vocês sabem o que acontece quando duas pessoas falam. Uma fala e outra lhe corta a palavra: ‘é exatamente como eu, eu…’ e começa a falar de si até que a primeira consiga por sua vez cortar: ‘é exatamente como eu, eu…’Essa frase ‘é exatamente como eu…’ parece ser uma maneira de continuar a reflexão do outro, mas é um engodo. É uma revolta brutal contra uma violência brutal: um esforço para libertar o nosso ouvido da escravidão e ocupar à força o ouvido do adversário. Pois toda a vida do homem entre os seus semelhantes nada mais é do que um combate para se apossar do ouvido do outro…”

Aliás, não só por essa citação mas pelo livro inteiro, se não o leu, eu fortemente lhe recomendo. Um abraço.

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