estou lendo vozes de tchernóbil, uma história oral da tragédia nuclear, escrita por svetlana alexievich, vencedora do nobel de literatura desse ano.
um livro lindo, belíssimo, incrível, que eu (atenção para o maior elogio que uma pessoa escritora pode fazer a outra) gostaria de ter escrito.
uma das histórias é de um professor de história que tinha acabado de descobrir o adultério de sua esposa e só conseguia pensar nisso, tinha até tentado o suicídio.
quando é convocado para trabalhar na limpeza de chernobil, ele pensa:
“se não estávamos em guerra, por que eu teria que arriscar a minha vida? e mais ainda se alguém comeu minha mulher! por que tem que ser eu, de novo, e não… “ele”?!”
durante os trabalhos, ele ganhou vários medalhas de valor, porque atuava sem nenhum medo da morte. para ele, nada daquilo era real. só conseguia pensar na traição que tinha sofrido.
no final do relato, ele conta a história de um moço que vivia em jerusalém na época de jesus.
ele estava em casa quando jesus passou carregando a cruz, tropeçou bem em frente a sua porta, se levantou, pegou a cruz de novo, voltou a carregar. e o homem dentro de casa, ouvindo toda aquela comoção, todo mundo chamando ele pra ver, mas ele não saiu:
estava morrendo de dor de dente.
e eu, alex, também professor de história como o autor desse relato, sei bem do que ele está falando. estudei história militar: sei quantas batalhas decisivas da humanidade foram perdidas porque algum general estava com dor de barriga e não conseguia se concentrar na batalha.
o que é a História Humana, assim em maiúsculas, com toda sua grandeza abstrata, comparada a uma raiz exposta, a um coração partido?
Uma resposta em “o que é a História comparada a uma dor de dente?”
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