assim que assumo a posição de meia-lótus, cruzo as pernas e pouso as mãos em frente ao umbigo, é nessa hora que meu nariz coça.
primeiro, vem a negação, imediatamente seguida pela revolta. caralho, não acredito que meu nariz escolheu coçar justo agora. putaqueopariu.
quanto mais tento esvaziar a mente, mais a coceira aumenta. em breve, a coceira está do tamanho do mundo. a coceira é maior do que eu, do que a vida, do que kafka, do que o sol, do que a vacuidade, dp que a morte.
a coceira é o universo. ali. na ponta do meu nariz.
mas não posso me mexer.
aí, vem a barganha.
que besteira!, penso. ninguém vai me ver. estão todos sentados, voltados pra parede, concentrados na prática. e, afinal, o que tem de mais coçar o nariz? o nariz não está coçando mesmo? não sou livre? não estou no templo praticando zen por vontade própria? não posso me levantar e ir embora a qualquer momento? por que não poderia coçar o nariz?
mas não. vai fazer barulho. o cotovelo vai estalar. o tecido da minha roupa vai farfalhar. naquele silêncio absoluto, esses sons seriam quase ensurdecedores.
então, a coceira some.
como tudo no universo, como nossas vidas, como as árvores, como o próprio sol, a coceira também passa.
porque se eu sinto coceira e não preciso coçar, então eu posso sentir fome e não preciso comer. posso sentir cansaço e não preciso sentar. posso sentir ira e não preciso gritar. posso sentir desprezo e não preciso humilhar.
porque a fome, o cansaço, a ira, o desprezo também passam.
Uma resposta em “zazen”
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