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leituras de 2016

minhas leituras são a história da minha vida.

minhas leituras são a história da minha vida.

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convenções da lista

título, autor, data da escritura, idioma original. (organizador, tradutor, data da organização e/ou tradução) data da leitura.

quando são dadas várias traduções de uma mesma obra, a primeira foi a principal e as demais usadas para cotejo.

considero um livro “lido” e acrescento nessa lista quando li o suficiente sobre ele para sentir que posso escrever sobre ele sem estar blefando: o critério é subjetivo e varia de obra a obra.

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janeiro

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janeiro foi um mês de férias onde, além das leituras para trabalho (trabalho = livro das prisões), eu me permiti várias leituras por prazer: hamlet, livro de samuel, divina comédia.

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1. the tragedy of hamlet, prince of denmark, de william shakespeare, 1603, inglês. releitura. (leitura original: c.1989.)

“um bando de citação, uma atrás da outra!”

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2. o mundo de ulisses, de moses finley, 1953, inglês. (trad: armando cerqueira, 1972?) releitura. (leit.or.abr96.)

3a. ilíada, de homero, c.XI aec, grego. (trad: frederico lourenço, 2005.)

3b. iliad. (alexander pope, 1720.)

3c. (stanley lombardo, 1997.)

4. homero, ilíada, de alessandro baricco, 2004, italiano. (trad: xavier gonzalez rovira, 2005). releitura. (leit.or.mar15.)

5. memorial, an excavation of the iliad, de alice oswald, 2011, inglês. releitura. (leit.or.jul12.)

ilíada: meu terceiro livro favorito. finley, um dos meus classicistas favoritos. baricco: recriação em prosa, sem os deuses. oswald: recriação em verso, só com as mortes e as símiles; de tirar o fôlego, recuperou meu interesse pela ilíada quando já tinha perdido. lourenço: melhor tradução em português, a que eu mais recomendo, mais acessível. lombardo: para quem lê inglês, uma tradução coloquial, bruta, violenta, apaixonante. pope: uma das grandes traduções de todos os tempos, simplesmente deliciosa, levou a ilíada a novas alturas, uma colaboração entre dois grandes poetas, tive orgasmos estéticos lendo.

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6. lingo, a language spotter’s guide to europe, de gaston dorren, 2014, holandês. (trad: alison edwards, 2014.)

só por diversão. bobo.

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7. scarcity: why having too little means so much, de sendhil mullainathan e eldar shafir, 2013, inglês.

8. on being certain: believing you are right even when you’re not, by robert burton, 2008, inglês.

9. the black swan: the impact of the highly improbable fragility, 2ª edição, de nassim nicholas taleb, 2010 (1ª ed: 2007), inglês.

10. happiness, a history, de darrin m. mcmahon, 2006, inglês.

não-ficção, lidos como pesquisa para o livro das prisões. todos excelentes.

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11a. segundo livro de samuel, de anônimo, c.630–540 aec, hebráico. (bíblia do peregrino, ed: luís alonso schökel, 1997; trad: ivo stormiolo e josé bortolini, 2002.)

11b. segundo samuel. (bíblia de jerusalem, 1973; trad: jorge cesar mota, 1985.)

11c. the second book of samuel. (kjv: king james bible, 1611.)

11d. 2 samuel. (nrsv: new revised standard version, 1990; trad: steven l. mckenzie.)

11e. segundo livro de samuel. (bíblia pastoral, 1990; trad: ivo storniolo e euclides martins balancin.)

11f. segundo libro de samuel. (bíblia reina-valera, 1569, revisada 1960.)

11g. o segundo livro de samuel. (ntlh: nova tradução na linguagem de hoje, 2000; trad: sociedade bíblica do brasil.)

11h. 2 samuel. (esv: english standard version, 2001; trad: good news publishers.)

11i. libro segundo de samuel. (bíblia de jerusalén, 1998; trad: m. villanueva, 2009.)

11j. o segundo livro de samuel. (bíblia do pregador: almeida revista e atualizada, 1993; trad: joão ferreira de almeida, 1654.)

o livro de samuel, como um todo, é um de meus favoritos da bíblia, que é meu livro preferido. gosto de ler várias traduções ao mesmo tempo. li a de jerusalém, em português, de cabo a rabo, e agora estou lendo a do peregrino, como bíblia primária, cotejando com as outras. essas duas são seguramente as melhores bíblias de estudo do brasil. pastoral: bíblia da teologia da libertação, com deliciosas notas marxistas. king james, reina valera, ferreira de almeida: as bíblias mais tradicionais das línguas inglesa, espanhola e portuguesa, que exerceram gigantesca influencia no estilo literário dessas culturas. nrsv: talvez a melhor bíblia contemporânea em inglês. ntlh: excelente versão brasileira na linguagem de hoje.

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12a. the divine comedy, de dante alighieri, c.1320, italiano. (trad: allen mandelbaum, 1980-4.)

12b. (c. h. sisson, 1980.)

12c. (charles eliot morton, 1891.)

12d. (henry cary, 1814.)

12e. a divina comédia. (trad: vasco graça moura, 1995.)

12f. (ítalo eugênio mauro, 1998.)

apaixonado por dante. mais uma vez, utilizando várias traduções, para comparar o estilo e ler as notas. graça moura e eugênio mauro: têm a vantagem de serem em verso rimado, como o original, mas são muitas vezes duras e ininteligíveis. morton: texto em prosa, mas límpido, bom pra resolver dúvidas. sisson: a mais literal, em verso, perfeita para tirar dúvidas, mas quase sempre sem poesia nem beleza alguma. cary: celebrada, mas antiquada demais pro meu ouvido. mandelbaum: na minha opinião, a melhor, mais bela, mais fluente; é a tradução primária que estou lendo e que eu mais recomendo.

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fevereiro

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os meses de fevereiro e março eu passei em cuba, lançando por lá a autobiografia do poeta-escravo e lendo textos filosóficos para a Prisão Felicidade.

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13a. confessions, de agostinho de hipona, c.400, latim. (trad: henry chadwick, 1991.) releitura. (leit.or.1995.)

13b. confesiones. (eugenio de zeballos.)

tem pessoas autoras com quem temos uma conexão tão forte. agostinho de hipona é como se fosse um velho amigo. impossível não pensar nele como um daqueles bróders que já carreguei depois da bebedeira mas que hoje não bebe mais. uma pessoa sempre interessante e fascinante, não apenas pela nova vida que conscientemente abraçou, e sobre a qual fala com intensidade única, mas também pela antiga vida devassa que podemos perceber aqui e ali, por entre as frestas da nova, através de seus comentários sempre mordazes. li as suas confissões aos 21 anos. reli agora, em cuba, no dia em que completei 42. é incrível como o livro melhorou desde a época em que eu era um moleque ateu que sabia tudo de tudo, até hoje, quando sou um homem de meia-idade que não sabe nada de nada, e se descobre cada vez mais intensamente religioso. uma amiga me perguntou por que reler livros. é por isso. porque a gente muda. “as confissões” é um dos livros mais chacoalhadores que já li. fiquei mexido, emocionado, consternado. e muito, muito irmanado, muito próximo ao autor. eu recomendo as confissões de agostinho para qualquer pessoa que esteja a beira de uma grande decisão que simplesmente não consegue tomar.

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14. the happiness industry: how the government and big business sold us well-being, de william davies, 2015, inglês.

incrível.

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15. paideia, los ideales de la cultura griega, tomo I, de werner jaeger, 1933, alemão. (trad: joaquín xirau, 1942.)

incrível, que PUTA trabalho de amor intelectual..

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16. história de la filosofía, tomo I, de nicola abbagnano, 1946-50, italiano. (trad: j. estelrich, 1954.)

bem didático e instrutivo, para suprir lacunas na educação. nota: tomo I: da filosofia antiga à escolástica, termina em ockram.

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17a. job, de anônimo, c.VI aec, hebraico. (bíblia de jerusalén, 1998; trad: m. villanueva, 2009.)

17b. (la biblia latinoamérica, edición pastoral. 1972, revisada 2005.)

17c. o livro de jó. (ntlh: nova tradução na linguagem de hoje, 2000; trad: sociedade bíblica do brasil.)

talvez o meu livro preferido da bíblia, e maior libelo ateu de todos os tempos. a tradução da bíblia de jerusalem é TÃO imensamente superior às outras que é até covardia: nas outras, a poesia se perde totalmente.

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18a. discussions at tusculum, de cícero, c.45aec, latim. (trad: michael grant, 1971.)

18b. tusculan disputations. (c.d.yonge, 1877.)

muito bom.

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19a. on the happy life, de sêneca, c.52, latim. (trad: john davie, 2007.)

19b. tratado de la vida bienaventurada. (pedro fernández navarrete.)

excelente. me senti representado e acolhido.

20a. on the shortness of life, de sêneca, c.53, latim. (trad: john davie, 2007.)

20b. tratado de la brevedad de la vida. (pedro fernández navarrete.)

tão bom que chega a ser auto-evidente.

21. on the tranquility of the mind, de sêneca, c.60, latim. (trad: john davie, 2007.)

achei fraco.

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24a. the nicomachean ethics, de aristóteles, c.IV aec, grego. (trad: david ross, 1925.)

24b. ética a nicómaco. (vicente gutiérrez, 2000.)

lendo e absorvendo. concordo violentamente do que concordo, discordo violentamente do que discordo.

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25. miseria de la prosperidad: la religión del mercado y sus enemigos, de pascal bruckner, 2002, francês. (trad: amelia ros, 2003)

de pirar o cabeção.

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março

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ainda em cuba, continuei o ciclo de leituras filosóficas para a Prisão Felicidade e comecei um novo ciclo de leituras econômicas para a Prisão Crescimento:

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26. perpetual euphoria, on the duty to be happy, de pascal bruckner, 2000, francês. (trad: steven randall, 2010.)

um dos poucos pensadores atuais que realmente merece o rótulo de iconoclasta.

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27. the happiness myth, why what we think is right is wrong, de jannifer michael hecht, 2007, inglês.

o objetivo da autora é historicizar a felicidade. ou seja, mostrar que as coisas que nos fazem felizes hoje, que nos parecem tão petrificadas no tempo, na verdade são recentes e que, há pouco tempo, coisas opostas nos faziam felizes, e que as noções tanto de felicidade quanto das coisas que nos fazem felizes são muito variáveis. o livro é tudo que um livro de história deveria e poderia ser: ao chamar atenção para a historicidade dos conceitos, a autora ajuda a pessoa leitora a questionar o senso-comum, às vezes, sufocante de sua própria época. ou seja, é um livro altamente subversivo. além de ser muito, muito engraçada, a autora é abertamente polêmica: entre outras coisas, ela defende o uso de drogas para alcançar a felicidade e afirma que não existe nenhuma base factual para nossa obssessão com fitness e exercícios físicos.

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28. a brief history of happiness, de nicholas p. white, 2006, inglês.

pela primeira vez, sublinhei tanto de um livro que cheguei ao limite de sublinhados do kindle: o aparelho simplesmente não me deixou sublinhar mais. muito, muito bom. ao contrário da história da felicidade de mcmahon, lida em janeiro, que é só uma antologia muito competente e bem pesquisada das diferentes concepções de felicidade pela história, white faz não só isso, como se posiciona a cada passo e aporta sempre novas conclusões, novos julgamentos, novos insights.

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29. prosperity without growth. economics for a finite planet, de tim jackson, 2009, inglês.

simplesmente sensacional. se eu tivesse que recomendar um livro curto que todas as pessoas do mundo deveriam ler, seria esse. um chamado para salvar nossa civilização.

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30. buddhist economics, a middle way for the market place, de p. a. payutto, 1988, tailandês. (trad: dhammavijaya e bruce evans, 1992.)

tem bons pontos.

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31. small is beautiful, a study of economics as if people mattered, de ernst friedrich schumacher, 1973, inglês.

um dos livros que dá início ao movimento ambientalista, lá quando ninguém ainda falava nisso.

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32. the acquisitive society, de r. h. tawney, 1920, inglês.

clássico do bom e velho e saudoso socialismo inglês da virada do século XIX pro XX, uma tradição que parece ter morrido com o hobsbawm.

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33. la bioeconomía de georgescu-roegen, de óscar carpintero, 2006, espanhol.

confesso que entendi pouco.

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34. zinky boys. soviet voices from the afghanisthan war, de svetlana alexievich, 1990, russo. (trad: julia e robin whitby, 1992.)

35. la guerra no tiene rostro de mujer, de svetlana alexievich, 1985, russo. (trad: yulia dobrovolskaia e zahara garcía gonzález, 2015.)

svetlana alexievich ganhou o nobel de literatura de 2015 e estou completamente, absurdamente apaixonado por ela. seus livros são lindos, comoventes, poderosos. histórias orais de grandes tragédias, escritas com muita sensibilidade, dando voz às vítimas. recomendo ler TUDO dessa autora.

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abril

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36. interbeing, fourteen guidelines for engaged buddhism, de thich nhat hanh, 1987, inglês.

fundador do budismo engajado, um dos meus ídolos. nesse livro, ele expõe e propõe as bases do movimento.

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37. deep economy: the wealth of communities and the durable future, de bill mckibben, 2007, inglês.

ainda para a Prisão Crescimento, um livro absolutamente fundamental, trazendo todos os ensinamentos dos livros anteriores ao século XXI.

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38. the faith to doubt: glimpses of buddhist uncertainty, de stephen batchelor, 1990, inglês.

batchelor, um dos principais expoentes do budismo secular, é um dos motivos de eu estar hoje praticando o caminho. eu leio tudo o que ele escreve e nunca me arrependo.

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39. a buddhist history of the west: studies in lack, de david r. loy, 2002, inglês.

david loy, outro grande expoente do budismo engajado, também é um dos responsáveis por eu estar praticando. essa sua história do ocidente a partir de uma perspectiva budista é um dos livros mais chacoalhadores que li, vira a nossa história de cabeça pra baixo, oferece uma perspectiva radicalmente nova — para nós, claro! um livro que mudou muita coisa na minha cabeça. as ideias de loy estão latentes sob a superfície do livro das prisões inteiro.

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maio

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em maio, comecei a ler para a Prisão Empatia, sobre altruísmo.

40. caring economics, conversations on altruism and compassion, between scientists, economists and the dalai lama, organizado por tania singer e matthieu ricard, 2015, inglês.

41. altruism: the power of compassion to change yourself and the world, de matthieu ricard, 2013, francês. (trad: charlotte mandell & sam gordon, 2015.)

o primeiro não é tão bom, mas serviu para me indicar o segundo, enciclopédico e incrível, resolveu todas as minhas dúvidas.

42. the age of empathy: nature’s lessons for a kinder society, de frans de waal, 2010, inglês.

waal defende a existência da empatia do mundo animal, para demonstrar a tese de que todos somos naturalmente empáticos.

43. altruism in humans, de c. daniel batson, 2011, inglês.

super acadêmico, muito instrutivo.

44. the selfish gene, de richard dawkins, 1976, inglês.

a obra clássica do dawkins. deliciosa. como é gostoso ler uma pessoa brilhante desvelando um argumento idem. apesar do título, ele não é exatamente sobre o assunto da Prisão Empatia, mas aproveitei a deixa pra ler, estava na minha fila há anos.

45. the most good you can do: how effective altruism is changing ideas about living ethically, de peter singer, 2015, inglês.

finalmente, se a empatia tem limites, o que podemos fazer a respeito?

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46. the fanaticism of the apocalypse: save the earth, punish human beings, de pascal bruckner, 2011, francês. (trad: steven rendall, 2013.)

47. no tempo das catástrofes: resistir à barbárie que se aproxima, de isabelle stengers, 2009, francês. (trad: eloísa araujo ribeiro, 2015.)

para a Prisão Crescimento, duas pessoas franceses argumentando uma contra a outra. minha tendência é concordar com stengers, que escreve com aquela prosa intelectual estilo francesa chata da porra (não adianta, sou anglófono) mas amo a iconoclastia do bruckner até quando ele argumenta contra mim.

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redirect: the surprising new science of psychological change, de timothy d. wilson, 2011, inglês.

uma leitura sobre um tema que perspassa todo o livro das prisões: o poder das narrativas, tanto para nos prender como para nos libertar.

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48. as piadas de zizek: você já ouviu aquela sobre hegel e a negação?, de slavoj zizek, 2014, inglês. (trad: rogério bettoni, 2015.)

muito, muito engraçado,

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depois de muitos livros densos, diálogos platônicos para relaxar.

50a. euthyphro, de platão, c.395AEC, grego. (trad: hugh tredennick, 1954.)

50b. (benjamin jowett, 1891.)

51a. the apology, de platão, c.395AEC, grego. (trad: hugh tredennick, 1954.)

51b. defesa de sócrates. (jaime bruna, 1957.)

51c. apology. (benjamin jowett, 1891.)

51d. the apology. (w. h. d. rouse, 1950.)

52a. crito, de platão, c.395AEC, grego. (trad: hugh tredennick, 1954.)

52b. (w. h. d. rouse, 1950.)

52c. (benjamin jowett, 1891.)

ler platão é uma delícia. esses três diálogos pertencem ao ciclo da morte de socrátes. o segundo é aquele que todo mundo deveria ler, o discurso de sócrates ao ser condenado à morte, mas meu preferido é o terceiro, onde um amigo de sócrates, crito, o visita na cadeia, nas vésperas de sua execução, com um plano de fuga perfeito para salvá-lo. só tem um problema: o prisioneiro não quer fugir. é um dos momentos mais lindos e surreais da história da filosofia ver o pobre crito tentando argumentar com sócrates que ele deve se salvar e levando um surra retórica do mestre, que contra-argumenta que ele deve morrer. tem momentos que quase dá pra ver crito pensar: “gente, por que mesmo que eu quero salvar esse mala, hein?”

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53. buddhism, a short history, de edward conze, 1980, inglês. releitura. (leit.or.2011.)

falando em sócrates, conze é tipo um sócrates dos estudos budistas, um alemão que sabia tudo de tudo de budismo, absolutamente brilhante mas rabugento e impaciente.

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54. a new buddhist path, enlightenment, evolution and ethics in the modern world, de david r. loy, 2015, inglês.

55. after buddhism: rethinking the dharma for a secular age, de stephen batchelor, 2015, inglês.

os dois livros mais recentes dos meus professores loy e batchelor, sobre quem já falei acima, sempre sobre o tema fundamental de adaptar o budismo ao mundo ocidental contemporâneo… e vice-versa.

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junho

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em junho, para a Prisão Eu, li dos textos fundamentais do budismo.

56a. verses from the center, de nagarjuna, c. séc. II, sânscrito. (trad: stephen batchelor, 2000, da tradução tibetana.)

56b. the fundamental wisdom of the middle way, nagarjuna’s mulamadhyamakakarika. (jay l. garfield, 1995, da tradução tibetana.)

56c. versos fundamentais do caminho do meio (mulamadhyamakakarika). (giuseppe ferraro, 2016, do original sânscrito.)

57. intuitions of the sublime (comentário a “verses from the center”), de stephen batchelor, 2000, inglês.

58. comentário a fundamental wisdom of the middle way, de jay l. garfield, inglês, 1995.

59. comentário a versos fundamentais do caminho do meio, de giuseppe ferraro, português, 2016.

como os comentários à obra do nagarjuna são muitas vezes, aliás quase sempre, maiores que a própria obra, preferi contá-los como uma nova obra. nagarjuna é o grande filósofo da vacuidade, um dos conceitos-chave do budismo.

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60a. guide to the bodhisattva’s way of life, de shantideva, c. séc. VIII, sânscrito. (trad: stephen batchelor, 1979, da tradução tibetana.)

60b. the bodhicaryavatara, de santideva. (kate crosby & andrew skilton, 1995.)

60c. guia do estilo de vida do bodhisattva. (trad. em 2015, da versão inglesa de neil elliot, 2003.)

por seu lado, santideva é o grande mestre da compaixão e do altruísmo. hoje, ele se tornou meu principal professor no caminho do bodhisattva. seu livro já é um dos mais importantes de toda a minha vida. recomendo muito. leiam.

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61. comciência, de patricia piccinini, 2015, inglês.

a exposição “comciência”, da australiana patricia piccinini, me impressionou tanto, que comprei o livro. faça uma busca na internet e confira as obras. é incrível.

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62. galileo, de bertolt brecht, 1938, alemão. (trad: charles laughton, 1945)

brecht é vida. li antes de ver a peça com denise fraga. um texto incrível, uma montagem idem. e ainda usei um trecho na Prisão Eu, que escrevi esse mês.

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julho

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continuando as leituras sobre budismo e cultura ocidental, que embasam todo o livro das prisões.

63. pyrrhonism: how the ancient greeks reinvented buddhism, de adrian kuzminski, inglês, 2010.

64. greek buddha: pyrrho’s encounter with early buddhism in central asia, de christopher i. beckwith, inglês, 2015.

65. the awakening of the west: the encounter of buddhism and western culture, de stephen batchelor, inglês, 1994

os primeiros dois exploram a interessantíssima conexão entre a filosofia budista e o pirronismo grego. basicamente, a semelhança não é coincidência: pirro foi à índia e trouxe muitos conceitos budistas de lá. o terceiro livro é mais um de stephen batchelor.

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66. o grande silêncio, uma introdução à meditação e ao zen, de alcio braz, português, 2016.

primeiro livro do médico psiquiatra e monge zen, responsável pelo templo zen de copacabana e meu professor, álcio braz. para quem está buscando uma porta de entrada no zen, esse livro é uma excelente introdução.

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finalmente, exausto de leituras densas, eu me dei férias, curtindo contos e noveletas de dois de meus autores favoritos.

67. burning secret, de stefan zweig, alemão, 1911. (trad: anthea bell, 2008.)

68. fear, de stefan zweig, alemão, 1936. (trad: anthea bell, 2010.)

69. confusion, de stefan zweig, alemão, 1927. (trad: anthea bell, 2002.)

70. journey into the past, de stefan zweig, alemão, c.1930. (trad: anthea bell, 2009.)

71. collected stories, de stefan zweig, alemão, c.1900-1940. (trad: anthea bell, 2013.)

zweig é um mestre. recomendo qualquer coleção de suas melhores histórias. a zahar tem novas edições ótimas. recomendo também assistir “grande hotel budapeste“.

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72. relíquias da casa velha, de machado de assis, português, 1906. releitura. (leit.or. 1997, 2014.)

73. páginas recolhidas, de machado de assis, português, 1899. releitura. (leit.or. 1997, 2014.)

74. histórias sem data, de machado de assis, português, 1884. releitura. (leit.or. 1997, 2014.)

75. ressurreição, de machado de assis, português, 1872.

reli alguns dos melhores livros de contos do machado, um dos meus romances preferidos (a mão e a luva, abaixo) e mais um romance jovem que me faltava. machado, mesmo se não fosse um grande escritor, para mim valeria a pena só pelo passeio pela minha cidade tão amada.

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agosto

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em agosto, voltei ao facebook: 75 livros em sete meses sem facebook; 21 em 5 com facebook.

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76. a mão e a luva, de machado de assis, português, 1874. releitura.

quem diz que esse é um romance menor claramente nunca leu com cuidado. sob certos ângulos, é um dos maiores. a maneira como ele subverte todas as expectativas românticas das leitoras é simplesmente brilhante.

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77. protagoras, de platão, c.395AEC, grego. (trad: stanley lombardo & karen bell, 1992.)

uma discussão sobre aquilo que pode ser ensinado. um dos diálogos mais contemporâneos de platão — se é que tem algum que não seja. substitua “sofista” por “coach”, e tudo se aplica ao mundo de hoje.

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setembro

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78. grande sertão: veredas, de joão guimarães rosa, 1956, português. releitura. (leit.or.ago.98.)

tudo o que um romance tem que ser. simplesmente perfeito. eu leio e fico emocionado, não emocionado pela trama em si, mas emocionado de estar vivo para ler, fruir, consumir, uma obra de arte tão perfeita, por ver a minha arte, o artesanato ao qual escolhi me dedicar, tão bem realizado por um grande, grande mestre. arte também é isso: é um homem ter morrido há tanto tempo e, ainda assim, fazer tanto por mim, hoje, agora. obrigado, viu, rosa?

79. sapiens: a brief history of humankind, de yuval harari, 2011, hebráico.

excelente. recomendo para todas as pessoas. uma das melhores histórias gerais que já vi. empolgante, inteligente, atualizada, aberta, inclusiva.

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outubro

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80a. evangelho segundo joão, séc.I ec, grego. (bíblia do peregrino, ed: luís alonso schökel, 1997; trad: ivo stormiolo e josé bortolini, 2002.)

80b. evangelho de joão. (bíblia de jerusalém, 1973, rev: 1998; trad: joaquim de arruda zamith, 1985.)

80c. the gospel according to john. (kjv: king james bible, 1611.)

80d. juan. (tla: traducción en lenguaje actual, 2003, sociedades biblicas unidas.)

80e. o evangelho de joão. (ntlh: nova tradução na linguagem de hoje, 2000; trad: sociedade bíblica do brasil.)

retomando contato com um evangelho poético e belo, mas que nunca foi um dos meus favoritos. (hoje, meu preferido é marcos. já foi lucas.) sempre digo que a luta pelo politicamente correto vale a pena porque a Palavra molda o mundo. se não acreditam em mim, é só ler o Evangelho de João: “No princípio era a Palavra, e a Palavra estava com Deus, e a Palavra era Deus. Todas as coisas foram feitas por meio da Palavra, e, sem a Palavra, nada do que foi feito se fez. A vida estava na Palavra e a vida era a luz dos homens. A luz resplandece nas trevas, e as trevas não prevaleceram contra a Palavra.”

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81. dhammapada, circa séc.III aec, páli. (trad: gil fronstal, 2005.)

82. the bodhicaryavatara, de santideva, circa séc. VIII, sânscrito. (kate crosby & andrew skilton, 1995.) releitura. (leit.or.jun16)

a diferença entre o dhammapada, importante texto do budismo theravada, e sua ênfase no autodesenvolvimento de sábios que estão acima dos pobres mortais, e o bodhicaryavatara (ou guia do estilo de vida do bodhisattva, na tradução brasileira, de santideva), importante texto do budismo mahayana, e sua ênfase em tentar salvar todos os seres sencientes, me pareceu bem semelhante à diferença entre os evangelhos gnósticos, propositalmente esotéricos e escritos somente para um pequeno grupo, e os quatro evangelhos canônicos, com sua mensagem aberta e inclusiva, atemporal e universal. confesso que peguei uma certa implicância com o dhammapada, e que passei a gostar ainda mais do bodhicaryavatara, que se tornou o texto mais importante do budismo para mim, e um dos textos mais importantes da minha vida.

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novembro

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em novembro, passei o mês na europa, onde fiz um retiro zen em auschwitz, na polônia. por isso, fiz uma tentativa de ler mais sobre a história do campo, e também sobre literatura polonesa.

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83. auschwitz: the nazis & the “final solution”, de laurence rees, 2005, inglês.

uma competente história de auschwitz.

84. eichmann in jerusalem: a report on the banality of evil, de hannah arendt, 1963, inglês.

sensacional análise do holocausto como um crime contra toda a humanidade.

85. this way for the gas, ladies and gentlemen, de tadeusz borowski, 1945, polonês. (trad: michael kandel, 1992)

não tem como uma obra literária sobre um campo de concentração ser melhor, mais dura, mais forte que essa. na minha opinião, melhor que primo levi.

86. man’s search for meaning, de viktor e. frankl, 1946, alemão. (trad: ilse lasch, ?)

um dos livros mais cheios de esperança que já li.

87. night, de elie wiesel, 1960, íidiche. (trad: marion wiesel, 2006.)

belíssimo.

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88. the manuscript found in saragossa, de jan potocki, 1814, francês. (trad: ian maclean, 1995.)

que feliz que estou de ter pego esse livro aleatoriamente em uma livraria da cracóvia: é um romance simplesmente único, delicioso, intrigante, pós-moderno, histórias dentro de histórias, que tem me deixado hipnotizado e apaixonado. só por essa obra potocki já entrou para a minha lista de grandes autores. mas, apesar de escrito por um dos maiores autores poloneses, não tem nada de polonês: foi escrito em francês e, em grande parte, se passa na espanha do século 17.

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89. el capitán alatriste, de arturo pérez-reverte, 1996, espanhol.

90. limpieza de sangre, de arturo pérez-reverte, 1997, espanhol.

“alatriste” é o capitão diego alatriste (1582-1643), protagonista de uma (absurdamente popular) série de livros de aventuras capa-e-espada escrita por arturo pérez-reverte. atualmente, já são sete livros, sendo que o primeiro saiu no brasil. pérez-reverte é um dos maiores autores de aventuras da espanha: já li um três livros dele e são todos sensacionais. (amo el club dumas.) eu já tinha ouvido falar da série do alatriste e já queria lê-la. então, estimulado pelo clima espanhol do livro de potocki, li os primeiros dois livros da série. recomendo qualquer livro do pérez-reverte.

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91. the selfishness of others: an essay on the fear of narcissism, de kristin dombeck, 2016, inglês.

um contraponto às pessoas que, como eu, veem narcisismo em tudo.

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92. turkey: a short history, de norman stone, 2012, inglês.

para eu não chegar no país totalmente ignorante da sua história.

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dezembro

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93. humans: from the beginning, de christopher seddon, 2015, inglês.

estou começando a brincar na minha cabeça com um projeto ficcional sobre a pré-história.

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94. the bible: the biography, de karen armstrong, 2007, inglês.

a bíblia é meu livro preferido, cada vez mais e sempre. karen armstrong é uma grande escritora sobre religião, que articula uma bibliografia enorme e ainda consegue escrever para o público-leigo.

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95a. on christian teaching, de agostinho de hipona, 397-426, latim. (trad: r. p. h. green, 1995.)

95b. on christian doctrine. (j. f. shaw, 1890.)

já falei sobre meu amor por agostinho em fevereiro. esse livro é uma jóia: são suas “dicas” para ler e interpretar a bíblia. o que pode ser melhor do que um dos seus autores preferidos explicando como ler seu livro preferido? basicamente, o argumento de agostinho é: a bíblia, por definição, ensina o amor. qualquer coisa que você leia e que pareça que não está ensinando o amor (tipo deus ordenando matanças etc) é porque você leu errado. ponto.

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96a. jeremias, de anônimo, c. séc.V aec, hebráico. (bíblia do peregrino, ed: luís alonso schökel, 1997; trad: ivo stormiolo e josé bortolini, 2002.)

96b. (bíblia de jerusalem, 1974/1998; trad: emmanuel bouzon, 1985.)

96c. the book of jeremiah. (kjv: king james bible, 1611.)

96d. jeremías. (tla: traducción en lenguaje actual, 2003, sociedades biblicas unidas.)

último livro do ano. passei quase o mês inteiro lendo, estudando, comparando. os profetas eram aquelas pessoas chamadas por deus para profetizar em israel, ou seja, para denunciar os abusos e pecados da população, para pregar que mudassem seus maus hábitos e para ameaçá-la com os castigos do senhor. era um trabalho duro, duríssimo: precisavam profetizar horrores sem fim para as pessoas que amavam e, naturalmente, sofrer a terrível reação. são talvez as figuras mais trágicas, mais atormentadas da bíblia. se você acredita em deus, são as pessoas escolhidas pelo senhor para tentar salvar o povo escolhido, mesmo a custa de sua morte social perante seus pares. e, se não acredita, são figuras mais trágicas ainda. talvez esquizofrênicos que ouviam vozes que acreditavam ser de seu amigo imaginário no céu? na minha leitura, gosto de imaginar os profetas como filósofos moralistas que inventaram estar profetizando mensagens desse tal iahweh (nominalmente adorado mas pouco obedecido) pois era a única maneira possível de, em um esforço heroico e altruísta, contra tudo e contra todos, enfrentando o escárnio e o ódio, desviar seu povo das práticas imorais e antiéticas que lhe estavam destruindo. ou seja, de maneira bem cristólogica, eram pessoas que sacrificaram a si mesmos, sua vida e sua paz de espírito, para salvar as outras.

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Sobre as leituras do ano

Línguas nas quais li: inglês (69), português (16), espanhol (11).

Línguas nas quais minhas leituras foram originalmente escritas: inglês 39; português 8; alemão 8; grego 7; latim 6; francês 6; hebraico 4; italiano 3; espanhol 3; sânscrito 3; russo 2; alemão 1; páli 1; polonês 1; iídiche 1; holandês 1; tailandês 1.

Leituras nos primeiros sete meses, sem Facebook: 75 (11 por mês)

Leituras nos últimos cinco meses, com Facebook: 21 (4 por mês)

Livros escritos por mulheres: 10 (de 96)

Livros sobre religião: 27 (de 96)

Livros de ficção: 25 (de 96)

Livros lidos especificamente por causa do livro das Prisões: 44 (de 96)

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A mesma ressalva de sempre

Fazer listas de livros reforça uma ideia que considero muito problemática:

Que “ler é bom”, que todas deveríamos “ler mais”, que ler é uma atividade intrinsecamente melhor do que a maioria das outras, etc.

Mas ler um livro não é mérito, não é vantagem alguma, não é algo para se gabar.

Mais importante, simplesmente ter lido um livro não significa que a pessoa leitora o entendeu, que tirou dele qualquer coisa de relevante, bela, prazeirosa ou útil.

Listar os livros que eu li faz tanto sentido quando listar os vagões de metrô que eu viajei. (Aliás, quase sempre, o 1022 e o 1026, que operam na linha um e são os últimos vagões de suas composições.)

E daí, não?

Apesar disso, incrivelmente, as pessoas pedem e perguntam.

Enfim, a verdade é que trabalho com livros. Para mim, pessoalmente, esse tipo de lista é relevante e me ajuda a sistematizar as leituras.

Então, apesar do efeito negativo de divulgar listas assim, esses foram alguns dos livros que li em 2016.

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